quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Angela Ales Bello Fenomenologia e Ciências humanas


 


 

                   

 Síntese: Paolo Cugini

 

 

 

Fenomenologia,

Psicologia e Historia

Capitulo 1

 

 

Pressupostos Históricos

 

 

o   Conceito de alma na filosofia Ocidental

v  Dos gregos ao renascimento

v  Da idade moderna a contemporânea

v  Significado de “Filosofia” e “ciência” na historia da filosofia ocidental

v  O positivismo

v  O idealismo

 

Capitulo 2

    • A Fenomenologia

v  A estrutura Transcendental do ser humano

 

Quais são estas vivencias? Quando nós começamos a fazer uma analise das vivencias, através da analise do corpo, chegamos à percepção. Trata-se de uma vivencia de que temos consciência. Outras vivencias são: a reflexão, a lembrança, a memória, a imaginação, a fantasia. Estes são exemplos de atos e vivencias presentes nos sujeitos humanos, portanto, são estruturas próprias de todos os homens.

Este aspecto evidenciado é universal, ou seja, o perceber, o refletir, a lembrança, a imaginação e a fantasia são iguais para todos, como atos, como vivencias, como estruturas de vivencias, ao passo que os conteúdos podem ser os mais diferentes possíveis.

Em suma, entender que a nossa vida tem uma estrutura comum, mas tem experiências com conteúdos diversos, nos permite superar o relativismo. Pois é verdade que nós não possuímos os mesmos conteúdos de experiências; Porem há um aspecto de universalidade presente em todos os seres humano: as vivencias, ou seja, operações, atos que todos os seres humanos possam realizar, pois compõem suas estruturas, pertencem à estrutura transcendental do ser humano: trata-se do que Husserl define como sujeito transcendental. Alguns desses atos são abertos em direção ao mundo externo, por exemplo, a percepção; outro, pelo contrario, são inerentes à vida interior.

            A reflexão é uma capacidade de examinar toda a estrutura do sujeito humano, é um ato reflexivo, talvez o, ato mais importante para o ser humano.

            Os atos psíquicos são os atos de reação. A reação Psíquica do medo pertence a dimensão dos atos emocionais e efetivos, esfera de vivencias que o ser humano encontra dentro de si mesmo em cada momento.

            Esses tipos de vivencias, especialmente as intelectuais e as da vontade, pertencem à dimensão do espírito – palavra muito importante que, em alemão, é Geist.O ser humano realiza um conjunto de atos próprios da dimensão do espírito.

            Estamos assim realizando uma analise de tipo transcendental, pois é a analise da estrutura do sujeito humano o qual vive diferentes vivencias tendo qualidades diversas, as quais remetem a três dimensões: corpo, psique e espírito. Portanto, o ser humano tripartido e não bipartido. As duas dimensões de espírito e psique podem ser chamadas de alma (os alemães dizem: Seele), utilizando um termo da tradição filosófica.

            O aspecto vital do ser humano divide-se em dois grupos de atos: atos que tem características psíquicas (no sentido de que imediatamente temos uma reação) e atos que tem capacidade de controlar essas reações (Como, por exemplo, a reflexão) que chamamos de atos de espírito, ou Géis. A capacidade de reflexão não é percepção nem uma reação afetiva, sendo ativada pela vontade: “quero refletir”.

            A consciência marca a diferença entre nos e o mundo animal. Ao mesmo tempo, porem, evidencia-se uma comunidade no mundo animal, pois há um corpo vivente com uma psique. Podemos ter também Einfühlung, ou seja, uma empatia com o mundo animal no sentido reconhecer os animais como seres viventes psíquicos.

            O ser humano é um ser cultural, porque é um ser espiritual, ou seja, é um ser que sabe produzir, que se expressa no nível que chamamos de espiritual. Isso não significa que o nível espiritual seja separado da psique. Além do mais, o ser humano, vive condições físicas inerentes ao corpo, as quais são muito importantes para o desenvolvimento da sua psique e do seu espírito.  

            A visão de mundo que os seres humanos possuem, implica a dimensão psíquica, e a dimensão espiritual, ou seja, a unidade do ser humano.

            No caso da cultura ocidental, há duas matrizes fundamentais: a filosofia grega - que desenvolveu a atividade de reflexão, de tomada de posição consciente acerca da realidade e de onde brotaram todas as filosofias posteriores e a ciência – e a matriz da tradição hebraico-cristã, especialmente o cristianismo onde o chamado divino apela para a singularidade, a responsabilidade individual. Esse é um elemento culturalmente importante que, unido à tradição grega, desenvolveu nos povos do Ocidente a capacidade da introspeção e o sentido da subjetividade; ao passo em que outras culturas esse elemento não é tão marcante e evidente, sendo predominante um modo de viver impessoal ou grupal (como em todas as culturas arcaicas).

 

 

o   Do positivismo às origens da fenomenologia

v  A Formação da Escola Fenomenologia

 

O método analítico significa que não se parte dos princípios sumos derivando deles as conseqüências, mas  parte-se do que se vê, buscando compreender e descrever o dado. Este é o elemento comum a toda escola. Portanto, o método de Husserl é aceito por toda a escola e nesse sentido podemos dizer que há uma escola fenomenológica, a qual aceita esta maneira de “ir ao encontro das coisas”, não partindo de idéias preconcebidas, já feitas.

 

v  O Problema do Método em Fenomenologia

 

Na fenomenologia, temos duas paradas: Uma primeira parada, que é muito importante, provem da capacidade de intuição, a qual nos permite aprender, no sentido de captar o sentido das coisas. Em lugar de utilizar o termo sentido, utilizamos o termo essência é uma palavra antiga, que deriva da língua latina e que corresponde à palavra grega eidos, de onde deriva a palavra idéia. Para os gregos, especialmente Platão, a idéia é aquilo que nos conseguimos captar, aprender, tomar eidos das coisas de onde deriva a idéia que temos delas.

Husserl afirma que o primeiro passo desse caminho que é o método fenomenológico, é colocar em evidencia o fato de que nós conseguimos imediatamente captar o sentido (eidos) das coisas. Na língua alemã existem dois termos diferentes para distinguir entre a coisas de termos físicos (por exemplo, a mesa) e a coisa em termos não físicos (por exemplo, a republica), ao passo que na língua latina utilizamos o mesmo termo, em ambos os casos.

Husserl afirma que nós podemos imediatamente captar o sentido das coisas. Esse primeiro passo do método contrapõe-se ao positivismo, o qual afirma que interessa conhecer apenas aquilo que é útil, concreto, experimental, fatual – o que também correspondia à visão própria da física clássica. Husserl considera o fatual como concreto e existente, mas afirma que não nos interessa apenas este aspecto da existência – o fatual.

A existência fatual das coisas remete a constatação de que cada coisa tem o seu sentido. Então Husserl propõe colocar entre parênteses a existência das coisas, entendida como fatual(o que significa que esta não me interessa, não que não exista). Esse é o ponto importantíssimo do método husserliano, que não visa abordar o plano da existência fatual, mas o da essência da sentido das coisas, plano este que tinha sido eliminado pelo positivismo. Husserl, sendo matemático, entende a operação de colocar entre parênteses esse concreto fatual que interessava muito aos positivistas. Ele afirma que este plano de existência não lhe interessa, ao passo que lhe interessa entender qual é a essência das coisas, a essência ou o sentido das coisas.

O primeiro passo do método fenomenológico para atingir a essência se chama, em termos técnicos, redução a essência ou redução eidetica.

No caso redução eidetica, nós tiramos a existência fatual, sendo que permanece a essência. Isto significa: redução à essência. Não se trata de negar a essência, mas apenas de colocá-la de lado. Uma espécie de liquidação. Para Husserl, a existência é um fato obvio, não é aquilo que interessa, sendo que o lhe interessa é colocar em evidencia a essência.

O segundo passo do método é ainda mais difícil e, se quisermos entende-lo em relação à tradição filosófica, remete à Idade Moderna. Trata-se novamente de uma redução, mas desta vez redução ao sujeito, no sentido de que eu coloco entre parênteses o humano especifico. Por sujeito entende-se também, na linguagem não filosófica, os seres humanos, sendo que todos eles t~em uma estrutura comum, a qual pode ser entendida como estrutura do sujeito. Interessa-me compreender quem sou eu, mas não eu como individuo. para realizar esta redução, eu devo retirar a natureza circundante, tudo aquilo que me circunda: O mundo e Deus.

Existem então, no método fenomenológico, duas reduções: em primeiro lugar, a redução à essência, e em segundo lugar, a redução ao sujeito. Neste segundo passo, empreendemos a analise do que há no sujeito, seguindo as indicações de Husserl e iniciando pela percepção.

Se nós examinamos o que está dentro de nós (a vivencia do perceber e a folha como percebida), para indicar tudo isto, podemos usar uma palavra especifica do linguajar filosófico: imanente no sujeito. A folha como existente esta fora de nós, é transcendente. Então, imanência e transcendência são aplicadas, nesse caso, ao nosso conhecimento. O que interessa particularmente a Husserl nesse momento é a analise da imanência, no sentido daquilo que esta dentro do sujeito. Ao passo que o transcendente não lhe interessa, pois visa continuar o exame do sujeito. Ter consciência nesse caso significa: nós sabemos que estamos vivendo. Na analise das muitas vivencias possíveis, nós aprendemos que cada vivencia é acompanhada pela consciência.

A analise fenomenológica do perceber supera o plano da percepção e atua no nível de uma outra vivencia que é a reflexão, diversa da percepção e importantíssima para o ser humano. Podemos dizer também que refletir significa ter consciência: nesse caso, a consciência corresponde a um primeiro saber algo, não a uma reflexão sobre algo.

Nós realmente estamos voltados para fora e é difícil nós voltarmos para identificar o que esta acontecendo dentro de nós. Nós vemos, se é um caso de ver; nós tocamos, se é um caso de tocar; nós ouvimos, se é um caso de ouvir, ou seja nós percebemos objetos que são por nós percebidos e que num certo sentido entra em nós. Mas de que forma? pois não entram como objetos físicos, pois nós os aprendemos dentro, nós captamos dentro. O perceber esta dirigido para as coisas, por exemplo, os objetos do mundo físico, tende para: esta é a intencionalidade, o olhar que intenciona , captar e perceber o objeto. Nós nos damos conta pela consciência de que nós estamos tendo essa percepção enquanto as coisas permanecem fora. Perceber é uma vivencia muito importante porque nos coloca em contato direto com a realidade, porem nem todas as coisas podem ser percebidas diretamente, mas muitas são percebidas por nós, são lembradas, são recordadas. Quando algo é percebido, eu vejo, eu toco, isto é, os sentidos são ativados. Então, o perceber é entrar em contato diretamente e recordar é recordar aquilo que nós percebemos.

Imagine agora que esse livro seja verdade: que quer dizer imaginar? Não é uma percepção porque nesse caso o livro é branco e vermelho. Imaginar é ligado à nossa experiência anterior e significa efetivamente projetar coisas que nós talvez tenhamos percebido antes e que podemos completar com a nossa imaginação. O ato de imaginar não é igual ao ato da fantasia: a imaginação significa que nós organizamos as coisas de uma maneira diferente em relação a presença da realidade; fantasia significa que nós acrescentamos vínculos que não tem a ver com esta realidade, pois podemos projetar elementos novos com relação aquela coisa que nós estamos percebendo, ou criar um mundo, que chega ao ponto de ser alternativo ao mundo percebido. Pois nós temos uma capacidade criativa, claro que sempre relacionada a experiência. De fato, a atividade artística se enxerta exatamente nesse ponto: através da fantasia podemos não somente criar um mundo alternativo, mas também aprender os elementos mais importantes da realidade e criar um mundo diferente, pois a arte não tem somente uma função evasiva, mas também uma função explicativa da realidade.

Estas são todas vivencias: perceber, recordar, imaginar, fantasiar. São todas as vivencias, são todos atos do ser humano. Husserl usa também o termo ato (utilizamos o termo alemão Act ). Então perceber, imaginar, recordar, fantasiar, refletir: todas são vivencias.

O problema do conhecimento é um problema de reflexão, pois todos esses atos os quais pertencem à atividade intelectual, na sua forma mais plena, se estendem pela atividade reflexiva. Nós temos consciência de perceber, mas para entender o que é a percepção nós precisamos passar para o nível reflexivo. Não só percebemos as coisas que estão fora, mas percebemos também o nosso corpo.

Todas as nossas vivencias estão em movimento. então, a recordação se desenvolve como conjunto de vivencias, sendo que cada momento tem suas características, nenhum momento é igual ao outro. nós podemos até lembrar da mesma coisa, mas aquela coisa lembrada nunca é recordada do mesmo jeito, sendo que há também interferências na recordação. No relato, nós podemos acrescentar elementos novos: de fato o que é interessante na fenomenologia não é fixar algum conteúdo, mas a identificação da estrutura. Num dado momento, nós teremos uma vivencia em comum que poderia ser aquela perceptiva, por exemplo, “ver”. Vivencia como percepção é igual para todos, mas o conteúdo que estamos vendo não é igual no sentido da exata repetição. Neste ponto, resolve-se o problema do relativismo: cada um de nós tem a sua vida interior com seus conteúdos, mas as estruturas fundamentais desta vida interior podem ser captadas universalmente.

 

    

v  Relação sujeito-objeto e intencionalidade na fenomenologia

 

A fenomenologia não distingue de modo radical entre o sujeito e o objeto: o que conta é a ligação intencional entre os dois. Pois Husserl não queria falar de um sujeito que se contrapõe a um objeto, mas de um sujeito que, em certa medida, contem já em si os objetos, está em relação com os objetos.

 

o   A corporeidade segundo Husserl

v  Os fenômenos culturais na perspectiva de Husserl

 

Capitulo 3

 

o   Husserl e a Psicologia

v  Fenomenologia Psicológica e Fenomenologia Transcendental

v  Psique, consciência e Psicologia.

v  Psicologia e Ciências do Espírito

v  Motivo e motivação; sentimento, afetividade e valor.

v  Pólo ecológico, intersubjetividade e entropatia.

v  Psicologia Empírica e Psicologia Transcendental

v  Pessoa e Dasein: Husserl, Stein e Heidegger.

 

 

Capitulo 4

 

o   Husserl e a Historia

v  A Historia em a Crise das Ciências Européias

v  As estruturas essenciais da Historicidade humana

v  Historicidade Humana, Historia e Historiografia.

v  A historia e a sua dimensão ideal

v  Ciências Naturais e Ciências do Espírito

 

Parte 2

 

o   Arqueologia Fenomenológica do Sagrado e Religioso

 

Capitulo 1

o   Fenomenologia: Da estrutura das Vivencias às Formas Culturais

 

v  Analise fenomenológica das culturas

v  A necessidade de um método

v  A consciência Transcendental

v  Eu puro e eu Psicológico

v  Intencionalidade e Entropatia

 

Capitulo 2

 

o   Arqueologia Fenomenológica

 

v  Arqueologia Fenomenológica da Cultura Ocidental

v  Arqueologia Fenomenológica da relação Sujeito-objeto: e Noetica

 

Capitulo 3

 

o   Hiletica e Noetica nas Culturas

 

v  Corporeidade e Consciência

v  Espaço e Tempo

v  Cultura e Teorização

v  Diversidade Cultural e Estruturas Humanas Universais: Superação do Relativismo

Capitulo 4

 

o   Hiletica e Noetica no Significado Sagrado e Religioso

 

v  Da sensação ao significado Simbólico

 

            O caminho que percorremos foi o seguinte:

Inicialmente tratamos do método fenomenológico, assim como proposto por Husserl. os dois passos do método, os dois pontos sucessivos são: 1) a redução à essência, a identificação do momento essencial; 2) a aplicação desta redução eidética no âmbito da subjetividade, colocando em evidencia, neste âmbito, a dimensão das vivencias. Como entramos neste âmbito? Examinando uma operação ou um ato que cumprimos normalmente, em particular, ao ato da percepção. Depois, falamos também de tantos outros atos, presentes na consciência, isto é, atos dos quais temos consciência.

e vimos que estes atos podem ser re-agrupados, segundo suas qualidades, em três momentos fundamentais que remetem da consciência às realidades que vivemos, que encontramos. Por exemplo – nós vimos – a percepção remete à corporeidade  á esfera dos impulsos, dos instintos, das emoções. e os atos que se referem aos instintos, aos impulsos e às emoções remetem à esfera psíquica. os atos de vontade, de inteligência, de decisão, de pensar, remetem á esfera espiritual, que é também uma esfera valorativa.

* Lendo os textos de Husserl, fomos mais a fundo na análise da subjetividade: examinamos o que acontece justamente no nível corpóreo, na identificação da esfera da sensibilidade. Notamos que Husserl identifica uma esfera que ele chama de hilética, que tem uma face voltada para o mundo exterior – os dados de cor, de som... – e os dados de sensibilidade interior – prazer, dor, bem-estar, mal-estar. Então, nós notamos que a esfera hilética é voltada a corporeidade e à psique. De fato, no texto de Husserl que lemos está escrito que a psique tem um corpo, o eu, que é a corporeidade viva, o corpo vivo. Vimos que este conceito de corpo vivo é muito importante porque é o lugar da sensibilidade e da localização de todas as nossas sensações. Mas essas sensações são de ordem física (poderíamos dizer, usando um termo que não é propriamente husserliano) – dados de cor, de som... – e têm um aspecto mais interior que é o aspecto do bem-estar, do mal-estar, do prazer, que é o registro psíquico dos dados sensíveis. então a análise de Husserl vai escavando muito mais profundamente do que normalmente se diz que ele faz. Porque Husserl identifica essa esfera hilética que é muito importante para compreendermos a nossa vida, não somente no sentido do conhecimento dos objetos, mas do relacionamento vital que há entre o mundo externo e o sujeito humano. Então toda a esfera emotiva e afetiva vem a ser examinada.

Porém, não basta. O ser humano procede através de valorações que são próprias deste ato, deste ato que são os dados de som, de cor, de mal-estar, de bem-estar... Procede alguma atividade valorativa sobre o bem-estar, sobre o mal-estar que dá sentido à realidade física que nós estamos experimentando. (estamos usando o termo “realidade física” para nos entendermos; Husserl não utiliza). Então dados, bem-estar, valoração. a esfera valorativa é tratada por Husserl sempre com um termo tomado do grego: noesis, noetica. Podemos dizer que o aspecto noetico é aquele que Husserl chama de espiritual. E vimos que o momento noetico é considerado por ele como o mais importante.

         Husserl diz que é também possível formar uma hilética, isto é, um estudo da sensibilidade (no modo que dissemos). Husserl escreve essas suas reflexões na obra Idéias par uma Fenomenologia Pura e uma Filosofia Fenomenológica nos livros I e II – o segundo apresenta um aprofundamento sobre hilética e noetica com relação ao corpo: a percepção localiza, a valoração e o sentido destas percepções. Mas há também muitos manuscritos que não foram publicados enquanto Husserl estava vivo – escritos privados, anotações para si mesmo – em que ele trata de relação entre hilética e noetica (porque é um caminho para aprofundar ainda mais) e do que acontece na relação entre subjetividade e mundo externo, por exemplo.

         Vimos que o estudo da subjetividade não está fechado em si mesmo, que há uma abertura para mundo externo e que nele não estão somente as coisas físicas, mas estão também os outros seres humanos. Estudamos que há uma vivencia – a empatia que nos permite dizer que vivemos junto a outros que são como nós, semelhantes a nós. Então a pesquisa de Husserl se move fazendo referencia à subjetividade de cada um, ao mesmo tempo em que é estudada como elemento estrutural  presente em todos. E faz um estudo também entre a intersubjetividade: o ser humano não está sozinho. Há um ponto muito importante na filosofia de Husserl em que ele nos diz “mas talvez eu esteja só, aqui, fazendo esta minha reflexão”. De fato, este é um perigo que nós chamamos de solipsismo – palavra que vem de solus ipse (referencia a um só ser humano: Existe só este sujeito, só ele mesmo). E Husserl diz “não, não é verdade”. Existem também os outros, e o descobre porque existe o vivido da empatia. vimos um percurso que parte do sujeito, inicia no sujeito, mas vai em direção aos outros. Então podemos perguntar como os outros são, como todos estão organizados.

         Vimos que é daqui que nasce a comunidade, com todos os aspectos morais que nascem dos sujeitos humanos. Não só aspectos morais, mas também esses.  

         Sabemos que dentre os discípulos de Husserl, Edith Stein é quem acompanha muito diretamente uma parte de suas reflexões, e nunca esquece analise fenomenológica e seus resultados; mesmo quando ela procura incluir o pensamento medieval. Por exemplo, no livro a estrutura da pessoa humana, depois de falar de alguma antropologia filosófica contemporânea – como a da psicologia profunda de Junge e a de Heidegger (que era colega dela) – Stein faz uma analise do ser humano que mantém juntas, de maneira muito interessante, as analises fenomenológicas e algumas interpretações que vem do pensamento de são Tomás de Aquino. Começa com “o ser humano como coisa material e como organismo” e aqui é a analise de Husserl que conhecemos: o ser humano como animal e o ser animal. Vimos que a fenomenologia sempre faz essa relação com o mundo animal. Por exemplo, o material fônico animal em relação ao material fônico humano, expressão de sons, sinais afetivos, melodia. Qual é a diferença? Isso é uma coisa que a fenomenologia ensinava. Depois o problema de origem das espécies: gênero, espécie e individuo. A fenomenologia faz esta distinção, mas esta é mais antiga, tradicional, é medieval e aristotélica.

 

v Fenomenologia da Religião Gerardus Van der Leeuw

        

         Antes de mais nada, devemos nos perguntar o que vem a ser experiência religiosa.

         Tomemos o livro Fenomenologia da Religião, de Gerardus van der Leeuw, pensador holandês, flamengo, que escreve em alemão. Esse livro foi publicado originalmente em 1933 e é muito importante porque examina todas as religiões históricas para procurar a essência do fenômeno religioso. É o primeiro ponto do método de Husserl. Então religiões nos vêm ao encontro: são fenômenos porque se manifestam a nós. O que quer dizer que são religiões? Que têm um elemento comum que é, justamente, a religião. De outra maneira não diríamos que são religiões. Então elas são diferentes, claro, nós já falamos desta questão da diferença e da unidade. São diferentes sim, muito diferentes, mas há um elemento unitário que nos diz: “são religiões”. Se nós fizermos uma Historia da Arte, não faremos uma Historia da Religião. Se fizermos uma Historia das Doutrinas Políticas, não faremos uma Historia da Religião. O que isso quer dizer? Que estes fenômenos tem características diferentes e que também são fenômenos unitários.

         Aqui nós estamos, através da fenomenologia, vendo o que o ser humano vive como fenômeno. Então, os dois passos do método de Husserl: primeiro a identificação da essência do fenômeno religião, mas para procurar as características desse fenômeno, nós, precisamos ir ao sujeito humano. O segundo passo, a redução: ver quais as vivencias religiosas, como a religião se organiza aos aspectos que nos vivemos.A importância dessas obras de van der Leeuw é a de considerar a Historia das Religiões  desde as mais antigas, arcaicas, até as religiões históricas contemporâneas, procurando um elemento comum, sendo que raramente encontramos um historiador das religiões que faça este trabalho de interpretação. Esta é uma obra realmente importante.

         Van der Leeuw iniciou uma nova disciplina que é mesmo uma fenomenologia – analise do fenômeno – da religião. Interessante notar o titulo no singular – fenomenologia das Religiões seria a Historia das Religiões (como as religiões se constituem). Ao invés, van der Leeuw quer demonstrar que, conhecendo bem a historia de todas as religiões de modo profundo, depois de ter descrito e encontrado os elementos comuns das religiões, pode dizer o que é a Religião.

         Atenção: aqui não estamos nos ocupando do problema da existência ou não de Deus. Demonstrar que deus existe é um problema filosófico. Aqui estamos falando da experiência religiosa, que é aquela que nos diz: “Deus existe”, não tem o problema sobre a existência de Deus. Isso é muito importante para compreender o campo próprio de pesquisa.

         Ele examina também o fenômeno do ateísmo e formula uma resposta muito interessante pra este fenômeno, justamente a partir do ponto de vista da experiência humana.

v Senso Religioso e potencia

 

         O que van de Leeuw diz sobre a religião?

         Considerada pelos dois métodos – um horizontal e outro vertical – (são dois métodos dele, não de husserl) a religião é um fenômeno e procuraremos compreender a essência da religião. Segundo: onde procurar a essência da religião? No ser humano. Então, na experiência – se vê – o ser humano diz “Deus, deuses...”. Estamos querendo entender este fenômeno religioso. O que quer dizer para o ser humano ser religioso. Eis aqui o tema da subjetividade humana. Procuramos compreender o que há dentro, e o que há dentro em comum com os outros. Antes de mais nada o que há dentro e depois, o que há dentro também dos outros, porque os outros têm algo dentro. Sempre esse tema: a empatia, comunidade. Fazer isso no vertente religioso.

         Os dois métodos: Examinando a vida humana – ele diz – o homem não se limita a aceitar a vida que lhe é dada. (E aqui também podemos fazer uma comparação com o mundo animal). Na vida, o que o homem procura? Ele procura a potencia e, se não a encontra de maneira insuficiente, ele procura fazer com que penetre em sua vida a potencia na qual crê. E procura elevar sua vida, acrescê-la, conquistar um sentido mais amplo. Nos encontramos então na linha horizontal. para que serve a religião ao ser humano? Um primeiro modo de responder a que serve, é que a religião é a ampliação da vida até o extremo limite. O homem religioso procura uma vida mais rica, mais profunda, mais extensa. Ele deseja, espera para si a potencia. Em outras palavras, o homem procura na sua vida e para sua vida, uma superioridade, seja que ele aspire a servir-se dessa superioridade, dessa potencia, seja que ele deseje invocá-la, chamá-la. Além disso, observando a atividade humana – obra de arte, costumes, economia... – verificamos que são nessas coisas que o homem também procura a potencia. Quando o homem quer criar uma obra de arte, quando tenta criar uma vida em comum com outros – também no nível econômico, político -, nisso o homem sempre procura uma potencia, isto é, uma realização.

         Mas ao mesmo tempo o homem se da conta que todas essas realizações, todas essas potencias, não são a ultima realização, não são a ultima potencia, É nesse sentido, então que há um sentido de todas as coisas, um sentido mais profundo que chamamos  senso religioso. O senso religioso de algo, de uma coisa, é o mais amplo e mais profundo que possa existir. É o sentido do todo: é a ultima palavra. Ele usa a expressão latina homo religiosus. Segue o caminho da onipotência, da onisciência, do sentido ultimo. Onipotência no sentido de que a potencia se refere a todas as coisas, e compreensão de todas as coisas: sentido ultimo. E assim, ele gostaria de entender a vida, para  dominá-la. Então ele chega a uma superioridade ultima, mas essa superioridade ultima vem ao encontro dele, na linha vertical. Nós desejamos a potencia (linha horizontal). E a potencia vem ao nosso encontro, e não nos vem ao encontro na linha horizontal, mas na linha vertical. Ele diz, de fato, que o caminho vertical vai desde baixo até o alto e do alto até embaixo.

         E é uma espécie de revelação que vem de fora, alem do limite. Ou seja, nós seres humanos nos abrimos uma totalidade, a uma potencia E essa potencia nos vem ao encontro quando, no limite, nós sabemos que não podemos realizar.

         O homem que procura a potencia na vida, não somente chega até o limite, mas sabe-se conduzido a u pais estrangeiro. Não somente chega até um lugar onde se abre um instante infinito, mas enquanto esta caminhando, tem consciência de se encontrar a cada instante circundado de coisas prodigiosas e distantes. Não esta presente somente o que é superior, mas ele é tomado pelo superior. Não somente vê o trono do Senhor em direção ao qual ele teria feito seu coração correr rapidamente, mas ele sabe que aquele é um lugar formidável, sendo uma casa de Deus, uma porta do céu.

         Van der leeuw era um cristão luterano, daí ele trazer todas estas  imagens que são próprias da experiência religiosa cristã e diz: talvez sejam os anjos que chegam no seu acampamento, ou talvez sejam demônios que o seguem no caminho.

E aqui é interessante ver o aspecto positivo e negativo: o bem e o mal. Mas o homem sabe, com certeza – e aqui está a definição de religião – que alguma coisa vem em direção a ele no caminho.

         Pode ser que o anjo caminhe com ele e o guie com segurança esse é o elemento de confiança, de confiar-se, de entregar-se confiante. Então aceito a seguir o caminho. Pode ser, ao invés, que o anjo, com a espada flamejante, feche a estrada.

         Aqui Van der Leeuw esta se referindo ao ateísmo, que segundo ele é aquela postura do ser humano de não reconhecimento daquela potencia que lhe vem ao encontro. Para ele, não existe um ser humano que não seja religioso, porque esta abertura em direção à potencia e à totalidade é de todos os seres humanos. Porem, quando o anjo fecha a estrada (é uma imagem) ele quer dizer: não quero continuar sobre este caminho e digo que Deus não existe. Então para ele, o ateísmo é a religião da fuga, ou seja, o ser humano foge, ele não quer continuar a estrada, porem, ele não pode evitar a potencia, ele não pode ficar sem ela, então substitui outros elementos de potencia, ao invés daquela potencia de totalidade, então o sucesso, os negócios, o dinheiro – também coisas boas, não são necessariamente coisas más – a arte, a religião da humanidade, também a ciência... Não só coisas negativas, certamente também coisas positivas são trocadas como se fossem aquela potencia.

         De fato, van der Leeuw já tinha dito: o homem procura sempre a potencia também nas suas expressões culturais. A questão é se essas potencias podem dar a completude total, esta é grande pergunta.porem nós sabemos que há também uma interpretação da religião que poderia utilizar isso que nós dissemos até agora, dizendo “mas então é uma ilusão nossa”. E aqui van der Leeuw diz uma coisa muito importante. Ele não é filosofo mas é muito agudo. Esta potencia que nos vem ao encontro é estranha, é um estrangeiro, nos é alheia, isto é, não depende de nós. De nós depende a busca da potencia, mas encontra a potencia significa reconhecer algo de alheio, diferente, e potente, isto são a potencia..

         De fato, em Fenomenologia da Religião ela fala de alheio, estranho, estrangeiro, justamente porque não é encontrado no que é habitualmente nosso. Ainda que prolongássemos a vida humana o quanto quiséssemos, não nos encontramos na nossa vida humana, a não ser que ele viesse ao nosso encontro no caminho. Esta é a grande ilusão do ateísmo: a de encontrar a potencia como prolongamento das próprias atividades humanas.

 

v O Sagrado, s religião e a salvação.

 

         Eis uma outra definição de religião, quando há experiência religiosa vivida: se da quando uma potencia estranha totalmente diferente de nos se insere na vida.

         Rudolf Otto, examinando a Historia das Religiões, diz que no inicio, nas religiões arcaicas, a religião é vivida com estupor, como maravilhamento. E nas religiões históricas é vivida como fé. Então as reações do ser humano frente  a esta potencia é uma religião que pode ser de maravilhamento ou de fé.

         No ponto 3 do mesmo 110 temos os elementos que estão em todas as religiões e os elementos de afinidade: “O limite da potencialidade humana e o principio da potencialidade divina foram juntos o fim procurado e encontrado na religião de todos os tempos, isto é, a salvação”. Quer dizer que há um caminho que o ser humano faz, e é um caminho de abertura em direção à potencia. Quando chega a um certo ponto – esse é um ponto do limite – o homem se dá conta que ele não tem mais as forças. Então ele que superar esse limite e encontrar algo que lhe vem ao encontro. Então, nesse caso, “alheio” significa que não depende dele. E o que o homem quer desta potencia? Ser salvo. Depois o termo salvação pode significar muitas coisas. O homem quer a salvação. Van der Leeuw diz que na religião de todos os tempos esta salvação “pode ser acréscimo de vida,, melhora, aumento de beleza, ampliação, aprofundamento. Também estes são meios de salvação para o ser humano, também essas produções podem ser, de alguma maneira, salvação para o ser humano. Mas por salvação podemos também entender uma vida totalmente nova, pode conduzir a uma desvalorização da vida precedente, uma nova criação da vida que se recebe de fora. Em todo caso, a religião se orienta, se dirige sempre à salvação”. Não seria em relação À vida assim como se vive, assim como é vivida, mas se orienta em direção a uma vida que é superior a essa vida que vivemos. Então. “deste ponto de vista, toda religião é religião de redenção”.

         Escolhemos van der Leeuw porque ele nos da um belo exemplo do que se pode fazer com a questão religião. E o que é religião? É este desejo de potencia que se concretiza quando um elemento potente vem ao encontro. Vimos que van der Leeuw para aqui. Mas nós sabemos que antes há todo esse processo que acabamos de indicar. A religião é algo que se refere só a um sentido espiritual ou há outra coisa? Para nós, em geral, está ligada à espiritualidade, certamente. É verdade que essa busca de sentido é uma busca do espírito humano. Porem o ser humano não é só espírito. E nós podemos dizer que na arte, por exemplo, a utilização noetica é certamente do espírito, porem há todo esse dinamismo descrito antes, há também tudo isso. Examinando as religiões, notamos que não são somente um fato espiritual. Essa busca de potencia é uma busca que envolve o ser humano inteiro. Então, como o ser humano se coloca, em sua totalidade, diante dessa potencia? Como ele identifica a potencia? É claro que estamos fazendo uma analise fenomenológica. A gente não esta se perguntando qual a religião melhor, neste caso. Depois poderíamos fazer também isso. O que estamos dizendo agora não é valorativo de uma certa religião. Estamos vendo o que acontece quando o ser humano diz: “isto aqui é religioso”. Quando formula ritos, quando ele conta o mito com seus ritos, por que o faz com aqueles certos ritos? Por que adora certas coisas? E aqui a historia das religiões efetivamente nós diz que há uma diferença entre as religiões chamadas de arcaicas ou primitivas e as religiões históricas que são aquelas das quais nós temos noticia mais diariamente. Então há diferenças, mas há também continuidades.

        

 

v Especificidades e universalidades na experiência religiosa

 

         Van der Leeuw aponta que as categorias que conhecemos dentro do cristianismo – ele é um cristão, como vimos – como salvação, redenção, etc. estão presentes também, ainda que de maneiras diversas, em todas as religiões.

         Isso não quer dizer, para van der Leeuw, que o cristianismo não tenha um valor particular, próprio, especifico – isto é um problema muito importante na relação inter - religiosa. Porque se dizemos que há características comuns a todas as religiões, há o perigo de dizer que uma religião é igual a outra. Então aqui nós temos dois pontos de vista: o ponto de vista do fenomenólogo da religião, isto é, de quem faz a analise das religiões e sabe dizer porque são religiões e porque as religiões têm algo em comum (porque senão não seriam religiões); e o outro ponto de vista, do fiel da religião, que diz, como qualquer fiel, que a sua religião é aquela mais valida. O próprio van der Leeuw, quando examina todas as religiões, diz quais são as características especificas de todas essas religiões dizendo que há elementos conotativos essenciais.

         Neste livro, em que van der Leeuw fala como fenomenólogo da religião, ele encontra os elementos comuns entre todas as religiões, e encontra também as diferenças. A religião do distanciamento não é a religião da majestade e da humanidade, porem há elementos comuns, e o que todos querem: salvar-se, redimir, ter uma potencia que não pode depender de si mesmo mas de outro. Porem a religião crista apresenta uma resposta mais valida em relação às outras. Ele, diz então, “por isso é que sou cristão”. Mas dizendo isto ele não é mais um estudioso das religiões, mas é um ser humano que escolhe uma religião. Então temos todos esses aspectos a serem considerados.

 

v Unidade corpo-psique-espirito na relação

com a potencia: exemplos em diversas cultura

 

Examinando (de maneira sinetica) nas religiões arcaicas, por exemplo, a potencia se liga prioritariamente a elementos naturais.

         Façamos uma analise, seguindo a via da hilética, de por que o monte é sagrado. Precisamos ir adiante no contexto particular: por exemplo, a Serra da Piedade. Em todo lugar existe isso – é uma coisa muito interessante. Aquela montanha, como esta naquele dinamismo descrito logo antes? Notemos: percepção do monte – talvez não tocado mais visto. (como já dissemos, a vista é uma sensação particular porque não tem localização, enquanto que o tato é mais simples, tem localização; de fato Husserl estuda mesmo essa diferença, ela faz muito analise da visão, particularmente). então o corpo vivo vê o que? Vê o monte, isto é, vê uma figura que se distingue de alguma maneira – talvez proeminente -, algo que pode até causar um certo  medo – não se sabe o que é. É excepcional em relação ao contexto. Por exemplo, na Grécia, o monte Olimpo, que nem é tão alto, mas que por razões atmosféricas o cume esta sempre coberto de nuvens e não se vê bem: aquele é um fenômeno que impressiona. Então, esta impressão pode ser agradável, pode ser de temor ou pode trazer um maravilhamento: este algo que eu não sei o que é, é numinoso. Então, a potencia que aquelas pessoas procuravam – todos procuram a potencia – passa através desses elementos perceptíveis: a potencia mora ali. É claro que mesmo na coincidência religiosa arcaica não é o monte, como algo físico. Nós é que distinguimos o lugar físico e o lugar sagrado, mas na mentalidade primitiva, arcaica, o monte exatamente por trazer sensações interiores – que pode ser de segurança, medo, confiabilidade, um conjunto de sensações – poderia levar a dizer: “eu não sei o que é” – eis aí a via negativa. É algo estranho, eu não sei o que é? onde o coloco? No monte.

         Já nas regiões desérticas da áfrica acontece diferentemente. A historia de cinco aldeias africanas, escrita por um aluno nigeriano da Pontifícia Universidade Lateranense descreve sobre seu povo, mostrando como tem cultura  e tradição bastante semelhantes, mas também diferentes formas de rito. É a historia de como uma divindade se forma, se configura. Isso é uma interpretação, já que na mentalidade espontânea esse é um processo imediato.

 

 

v  Culturas e Religiões

o   Relação entre sagrado e religioso

 

A presença da divindade em diferentes culturas

 

Abordemos agora outro tema presente em culturas e Religiões: a relação entre sagrado e religioso. Iniciemos pelo tema presença, importante para compreender o fenômeno religioso e a relação entre o fiel e a divindade, e chegaremos à religião como fato coletivo (é ilusão da cultura secularizada, especialmente protestante, achar que é um fato pessoal privado).

         O tema da Presença da divindade nos leva ao tema de encarnação, fortemente ligado à questão da hilética. Vimos que a hilética é, essencialmente, a relação, entre nosso corpo, as sensações, as reações que são dentro mas o ser humano possui também toda uma dimensão espiritual e, portanto, realiza uma valoração desses elementos empíricos. Na experiência de encontro com o estranho – para utilizar a expressão de van der Leeuw -, mesmo sabendo que não se trata de algo sensível, o ser humano quer vê-lo também sensivelmente.

o   Sagrados femininos e a água

 

         Tales, o filosofo e matemático grego que foi ao Egito medir a pirâmide, dizia que a fonte, o nascimento, o principio de todas as coisas é a água. Na África há uma divindade feminina muito venerada na tradição da religião popular – não cristã – que se chama Deusa da água – Mammy Water. A água, sabemos é um elemento de vida. O que é a água? A água se bebe, alivia a sede, também serve para os campos. No Egito, por exemplo quando o rio Nilo transborda, é sinal de fertilidade.

         Isso é importante para o ser humano, porque ele busca potencia em sua vida, diz van der Leeuw. Procurar potencia significa também confiar-se a esses elementos poderosos.

         Então, as figuras femininas são frequentemente, as mais importantes em muitas culturas. Na origem, talvez, se tratasse de uma única divindade que, depois, se uniu a muitas outras.

         Continuemos com a questão de presença dessas divindades: como vê-las, como entrar em contato com essas presenças?

         No sul da Índia há um templo dedicado a uma jovem virgem – Kanya Kumari – e eles querem vê-la. Tomam dezesseis moças e, no primeiro dia, a deusa aparece como uma menina de uma ano. no segundo dia, uma menina de dois anos, e segue progressivamente até dezesseis anos. trata-se de aparição e crescimento da deusa, que como a lua, manifesta-se e depois desce. Esta manifestação de um fenômeno que nós dizemos físico, astronômicos é lido em termos sacros através da aparição da deusa. Isso mostra que é necessária também uma presença; e presença quer dizer; eu posso ver, tocar, ver – sobretudo ver – e, portanto, algo com o que estou em contato. esse estranho poderoso manifesta-se. É o tema da manifestação: é de caráter físico e, dentro, no sujeito, há uma reação. do ponto de vista religioso podemos dizer reação de segurança, de ajuda, de sustento, de modo que, depois, nós, do ponto de vista valorativo, dizemos: isto é o que me preenche de verdade.

         Outro exemplo na cultura grega: Na ilha de Creta, desde os séculos 12-13 a.C., construíam-se prédios, palácios, onde vivia um rei. havia uma sala delicada ao culto sagrado, mas vazia, porque a divindade devia manifestar-se. E. ás vezes, o fazia através do sacerdote ou sacerdotisa. Esperava-se a manifestação do sagrado.

         Em vista de uma avaliação global acerca dessas experiências, buscamos compreende-las justamente através da relação entre hilética e noetica: ver, tocar, sentir que, porem, não é o ver, tocar e sentir coisas físicas, mas uma realidade que se apresenta com uma potencia própria que preenche o ser humano e, a partir disso, se diz: “é a divindade”.

 

o   A encarnação da divindade

o   Os sacramentos no Cristianismo

o   Representações concretas do divino em varias religiões: necessidade de ver

o   Religiões e concepções de homem

o   A continuidade da cultura cristã

 

v  Apêndices

apêndice 1

o   Observações metodológicas sobre a historia das idéias

apêndice 2

o   Husserl, Heidegger, Scheler

 


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