editora:
EDUSC
,2001
Síntese: Paolo Cugini
1
Perspectivas Vamos para a Revolução Proletária?
É chegado o momento, há muito previsto, em
que o capitalismo está a ponto de ver seu desenvolvimento interrompido por
limites. De qualquer maneira que interpretemos o fenômeno da acumulação, está
claro o capitalismo significa essencialmente expansão econômica e que a
expansão capitalista não está mais longe do momento em que se chocará contra os
próprios limites da superfície terrestre. (p.11)
Quando um erro de quantidade atinge tais
proporções, é possível acreditar se trata de um erro referente à qualidade, ou,
em outras palavras, à própria natureza do regime cujas condições de existência
se quer definir. (p.15)
O
outro fenômeno fundamental de nossa época, quero dizer, o fascismo, também não
cabe mais facilmente que o estado russo nos esquemas do marxismo clássico. (p.17)
4
Reflexões sobre as causas da liberdade e da opressão social
Se considerarmos outros aspectos da
opressão capitalista, aparecem outras dificuldades ainda mais temíveis, ou, melhor
dizendo, a mesma dificuldade, iluminada por uma luz mais crua. A força que
possui a burguesia para explorar e oprimir reside nos próprios fundamentos de
nossa vida social, e não pode ser anulada por nenhuma transformação jurídica e
política. Essa força é, primeiro e essencialmente, o próprio regime da produção
moderna, a saber, a grande indústria. (p.59)
Constatar que o regime capitalista esmaga
milhões homens, isso não permite senão condená-lo moralmente; o quer constitui
a condenação histórica do regime é o fato de que, depois de ter tornado possível
o progresso da produção, ele o impede. A tarefa das revoluções essencialmente
na emancipação não dos homens, mas das forças produtivas. Na verdade, está
claro que, desde que estas tenham atingido um desenvolvimento suficiente para
que a produção possa cumprir às causas de pouco esforço, as duas tarefas coincidem;
e Marx supunha que tal é o caso na nossa época. Foi essa suposição que lhe
permitiu estabelecer um acordo indispensável a sua tranqüilidade moral entre
suas aspirações idealistas e sua concepção materialista da história.
A seus olhos, a técnica atual, uma
vez liberada das formas capitalistas da economia, pode dar aos homens desde já,
bastante descanso para lhes permitir um desenvolvimento harmonioso de suas
faculdades, e em consequência fazer desaparecer numa certa medida uma
especialização degradante estabelecida pelo capitalismo; e sobretudo ulterior
da técnica deve avaliar ainda mais a cada dia o peso da necessidade material, e
por uma consequência imediata o da submissão social, até que a humanidade
atinja uma estado propriamente paradisíaco, em que a produção mais abundante
custaria um esforço insignificante, em que a antiga maldição do trabalho seria
superada, enfim ,onde seria reencontrada a felicidade de Adão e Eva antes de
seu pecado. (p.61 62)
O termo “religião” pode surpreender quando
se trata de Marx; mas acreditar que nossa vontade converge com uma vontade
misteriosa que estaria em ação no mundo e nos ajudaria a vencer, e pensar
religiosamente, é acreditar na Providência. Aliás, o próprio vocabulário de
Marx o prova, uma vez que contem expressões quase místicas, tais como “missão
histórica do proletariado”. Essa religião das forças produtivas em nome da
quais gerações de empresários esmagou as massas trabalhadoras sem o menor
remorso constitui igualmente um fator de opressão no interior do movimento
socialista; todas as religiões fazem do homem um simples instrumento de
Providência e também o socialismo põe os homens a serviço do progresso
histórico, isto é, do progresso da produção. (p.64)
Mas se o estado atual da técnica não
basta para liberar os trabalhadores, pode–se ao menos razoavelmente esperar que
ele esteja destinado a um desenvolvimento ilimitado ,que não implicaria um crescimento ilimitado
do rendimento do trabalho? É o que todo mundo admite, tanto entre os
capitalistas quanto os socialistas, e sem o menor estudo prévio da questão; basta
que o rendimento do esforço humano tenha aumentado de uma maneira inaudita
séculos para que espere que esse crescimento prossiga no mesmo ritmo. (p.66)
Análise da Opressão
Trata-se, em uma suma, de conhecer o que
liga a opressão em geral e cada forma de opressão em particular ao regime de
produção; dito de outra forma, de chegar a perceber o mecanismo da opressão, a
compreender em virtude do que talvez ela pudesse teoricamente desaparecer. (p.77)
As causas da evolução social não devem
ser mais procuradas em outra parte que não nos esforços quotidianos dos homens
considerados como indivíduos. Esses esforços não se dirigem certamente para um
lugar qualquer; eles dependem para cada um, do temperamento, da educação, da
rotina, dos costumes, dos preconceitos, das necessidades naturais ou adquiridas
do ambiente, e sobretudo, de uma maneira geral, da natureza humana, termo que, apesar
de ser difícil de definir não é provavelmente vazio de sentido. Mas dada a
adversidade indefinida dos indivíduos, Dado sobretudo que a natureza humana
comporta entre outras coisas o poder de inovar, de criar, de superar-se , esse
tecido de esforços incoerentes produziria qualquer coisa em termo de
organização social, se ao acaso esse domínio não encontrasse limitado pelas
condições de existência às quais toda sociedade deve se conformar sobre pena
ser ou subjugada ou aniquilada. Essas condições de existência são mais
freqüentemente pelos homens q elas submetem; elas agem não impondo aos esforços
de cada um uma um direção determinada, mas condenando a serem ineficazes todos
os esforços dirigidos nos caminhos que elas interditam. (p.79-80)
Dentre todas as formas de organização
que a história nos apresenta, muito mais raras são aquelas que aparecem como
verdadeiramente livres de opressão: além disso, elas são muito mal conhecidas. Todas
correspondem a um nível extremamente baixo da produção, tão baixo que, nelas, a
divisão do trabalho é quase desconhecida, a não ser entre os sexos, e cada
família não produz mais que uma necessidade de consumir. É claro, aliás, que
uma tal condição material exclui forçosamente a opressão, uma vez que cada
homem,obrigado a se alimentar sozinho, está incessantemente às voltas com a natureza exterior; mesmo a
guerra nesse estágio, é guerra de pilhagem e extermínio ,não de conquista
porque faltam os meios para segurar a conquista e sobre tudo para tirar partido
dela. O que é surpreendente não é que a opressão apareça somente a partir das
formas mais elevadas da economia, é que ela sempre as acompanhe. Assim sendo, uma
economia realmente primitiva e as formas econômicas mais desenvolvidas, não a
somente diferença de grau, mas também de natureza. (p.83)
A opressão procede exclusivamente das
condições objetivas. A primeira delas é a existência de privilégios; e não são
as leis ou os decretos dos homens que determinam os privilégios, nem os títulos
de propriedades; é a própria natureza das coisas. Algumas circunstâncias, quem
correspondem em duvidas a etapas inevitáveis do desenvolvimento humano, fazem
surgir forças que se interpõem entre os homens comuns e suas próprias condições
de existência, entre o esforço e o futuro do esforço, e que são por sua própria
existência, monopólio de alguns pelo fato que não podem ser repartidos entre
todos; desde então esses privilegiados, embora dependam e a igualdade perece. (p.85)
De uma maneira geral, entre seres humanos,
as relações de dominação e de submissão não sendo jamais plenamente aceitáveis,
constituem sempre de um desequilíbrio sem remédio e que se agrava perpetuamente;
assim ocorre mesmo no domínio da vida privada, onde o amor, por exemplo destrói
todo o equilíbrio da alma desde que procure subordinar-se a seu objeto ou
subordiná-lo. Mas ai pelo menos nada de exterior de opõe a que a razão volte a
por ordem estabelecendo a liberdade e a igualdade; enquanto que as relações
sociais, na media em que os próprios procedimentos, do trabalho e do combate
excluem a igualdade. Parecem fazer pesar a loucura sobre os homens como uma
fatalidade exterior. Pois pelo fato que não há jamais poder, mais uma corrida
pelo poder, mas essa corrida é sem fim, sem limite, sem medida, também não há
limite medidas nem para os esforços que ela exige; aqueles que a ela entrega, obrigado
a fazer sempre mais que os rivais, quem para seu lado se esforçam para fazer
mais que aqueles, devem sacrificar não somente a existência de escravos, mas se
sua própria e de seus seres mais caros; é assim que Agamenon imolando sua filha
revive nos capitalistas que, para manter seus privilégios, aceitam sem remorsos
guerras capazes de arrebatar-lhe seus filhos.
(p.89)
Assim, a corrida pelo poder submete todo
mundo, tanto os poderosos como os fracos. Marx o percebeu bem no que se referem
ao sistema capitalista. (p.89)
A lei de todas as atividades que dominam
a existência social é, ao contrario exceção feita às sociedades primitivas
-,que cada uma nela sacrifique uma vida humana, em si e em outrem, por coisas
não constituem senão meios de viver melhor.Esse sacrifício se reveste de formas
diversas, mas tudo se resume a questão do poder. O poder, por definição, não
constitui senão um meio; ou, para dizer melhor, possuir um poder consiste em
possuir meios de ação que ultrapassam a força tão restrita da qual o individua
dispõe a sim mesmo. Mas a busca do poder, até pelo fato que é essencialmente
impotente para apoderar-se de seu objetivo, exclui qualquer consideração de
fim, e, por uma inversão inevitável, chega a ocupar o lugar de todos os fins. É
essa inversão de relação entre o meio e o fim, é essa loucura fundamental que
dá conta de tudo aquilo que há se insensato e de sangrento ao longo de toda
história. A história humana é a história da escravidão que faz dos homens
,tanto opressores quanto oprimidos ,simples joguetes de instrumentos de
dominação que eles próprios fabricam ,e sujeita assim a humanidade viva a ser a
coisas das coisas insertas .
Assim, não são os homens, mas as coisas,
que dão a essa corrida vertiginosa ao poder seu limite e suas leis. Os desejos
dos homens são impotentes para regulá-la. (p.91)
Um estudo científico da história deveria
começar pela análise das reações exercidas a casa instante pelo poder sobre as
condições que fixam objetivamente seus limites; e um esboço hipotético do jogo dessas
reações é indispensável para guiar tal análise, aliás difícil demais diante de
nossas possibilidades atuais. Algumas dessas reações são cocientes e
desejadas.Todo poder se esforça conscientemente, na medida de seus meios,
medida determinada pela organização social ,para melhorar em seu próprio
domínio a produção e o controle; a história fornece inúmeros exemplos disso
,desde os faraós até os nossos dias, e é nisso que se apóia a noção de
despotismo esclarecido.Em compensação, todo poder se esforça também, e sempre
conscientemente,para destruir entre os rivais os meios de produzir e de
administrar ,e é da parte deles o objeto de uma tentativa análoga . Assim, a
luta pelo poder é ao mesmo tempo construtiva e destrutiva, e lava a ou um
progresso ou a uma decadência econômica conforme vença a construção ou a
destruição; e fica claro que uma determinada civilização a destruição se
operará tanto maior quanto mais difícil for a um poder ampliar-se sem se chocar
com poderes rivais de força quase igual. Mas às conseqüências indiretas do
exercício do poder tem muito mais importância do que os esforços conscientes
dos poderosos. Todo poder,pelo próprio fato de que se exerce ,estende até o
limite do possível as relações sociais sobre as quais repousa; assim, poder
militar multiplica as guerras, o capital comercial multiplica as trocas. (p.95
e 96)
Quadro Teórico de uma Sociedade
Livre
E, no entanto, nada no mundo pode impedir
o homem de se sentir nascido para a liberdade. Jamais, o que quer que aconteça,
ele pode aceitar a servidão; pois ele pensa. Ele nunca deixou de sonhar uma
liberdade sem limites, seja como uma felicidade passada da qual um castigo o
teria privado, seja como uma felicidade futura que lhe seria devida por uma espécie
de pacto por uma providencia misteriosa. O comunismo imaginado por Marx é uma
forma mais recente desse sonho. Esse sonho sempre foi útil, como todos os
outros, ou, se pôde consolar, senão como um ópio; é tempo se sonhar a renunciar
a liberdade, e decidir-se e concebê-la.
É a liberdade perfeita que é preciso
esforçar-se para imaginar claramente, não na esperança de atingi-la, mas na
esperança de atingir uma liberdade menos imperfeita do que nossa atual
condição; pois o melhor só é concebível pelo perfeito. Não podemos senão
guiarmos por um ideal. O ideal é tão irrealizável quanto o sonho, mas, diferentemente
do sonho, ele tem relação com a realidade; ele permite, a titulo de limite , classificar
situações reais ou realizáveis na ordem do menor para o maior valor. A liberdade
perfeita não pode ser concebida como consistindo simplesmente na desaparição
dessa necessidade cuja pressão sofremos permanentemente; enquanto o homem
viver, ou seja, enquanto constituir um ínfimo fragmento desse universo
impiedoso, a pressão da necessidade jamais enfraquecerá por um instante. (p.108)
A
verdadeira liberdade não se define por uma relação entre o desejo e a
satisfação, mas por uma relação entra o pensamento e a ação; seria
completamente livre o homem cujas relações procedessem todas de um julgamento
prévio concernindo ao fim que ele se propõe e ao encadeamento dos meios
próprios para levar a esse fim. Pouco importa que as ações em sim mesma sejam leves
ou dolorosas, e pouco importa se sejam coroadas de sucesso; a dor e o fracasso
pode tornar o homem infeliz, mas não pode humilhá-lo enquanto é ele mesmo de
sua própria faculdade de agir. E dispor de suas próprias ações não significa de
modo algum agir de arbitrariamente, ser chamadas de livres. Todo julgamento se
faz sobre uma situação objetiva, e, em conseqüência, por uma trama de
necessidades. O homem não pode em nenhum caso deixar de estar oprimido de todos
os lados por uma necessidade absolutamente inflexível; mas como ele pensa, tem
a escolha de ceder cegamente ao aguilhão pelo qual ele impede do exterior, ou
se conformar à representação que dela ele forja para si; e é nisso que consiste
a oposição não são, de resto, senão limites ideais nos quais se move a vida
humana sem jamais poder atingir nenhum,
sob pena de não ser mais a vida. Um seria completamente escravo se todos os
seus gestos procedessem de uma outra fonte que não seu pensamento ou seja, das
reações irracionais do corpo, ou do pensamento de outrem; o homem primitivo
esfomeado cujo os avanços são todos provocados pelos espasmos que lhe torcem as
entranhas, o escravo humano perpetuamente voltado para as ordens de uma vigia
munida pelo açoite, o operário moderno que trabalha na linha de montagem, todos
se aproximam dessa condição miserável. (p.109
e 110)
Mas existe ainda um outro fator de
servidão: é a existência, para cada um ,dos outros homens. E, se repararmos
bem, esse é mesmo o único fator de servidão; só o homem pode dominar o homem.
Mesmo os primitivos não seriam escravos da natureza se não atribuíssem a ela
seres imaginários análogos ao homem, e cujas vontades são ,aliás,interpretadas
por homens. Nesse caso, como em todos os outros é o mundo exterior que é a
fonte do poder; mas se por trás de fontes infinitas da natureza não houvesse,
seja por ficção, seja na realidade, vontades divinas ou humanas, a natureza
poderia destruir o homem, não humilhá-lo. A matéria pode desmentir as previsões
e arruinar os esforços, mas nem por isso deixa de ser inerte, feita para ser
concebida e manipulada do exterior; porem não se pode jamais penetrar ou
manipular de fora o pensamento humano. Na medida em que a sorte de um homem
depende de outros homens, sua vida própria vida escapa não somente às suas
mãos, mas também à sua inteligência; o julgamento e a revolução não têm mais
nada a que se aplicar ou a ameaçar; e a alma cai em abismos sem fundos de
desejos e de temor, pois não há limites para as satisfações e para os
sofrimentos quem um homem pode receber de outros homens. Essa dependência
aviltante não é só dos oprimidos, mas da mesma forma ,embora de maneiras
diferentes ,dos oprimidos e dos poderosos. Como um poderoso não vive senão de
seus escravos, a existência de um mundo inflexível lhe escapa quase
inteiramente; suas ordens lhe parecem conter em si mesma uma eficácia
misteriosa; a ele jamais é capaz, para falar propriamente, de querer, mas é
arrebatado por desejos aos quais jamais a visão clara da necessidade vem impor
um limite. Como ele não concebe outro método de ação senão comandar ,quando
acontece , frequentemente nos sonhos; e os medos são então ainda mais aterradores,
porque ele sente continuamente sobre si ameaça de seus rivais. Quanto aos
escravos, eles lutam continuamente com a matéria; só que sua sorte depende não
dessa matéria que eles agitam, mas de senhores aos caprichos dos quais não se
pode impor nem lei nem limites. (p.121 e
122)
Da mesma forma que o homem não é feito
para ser o joguete de uma natureza cega, ele também não é feito para ser o
joguete das coletividades cegas quem foram com seus semelhantes; mas para
deixar de estar entregue à sociedade tão passivamente quanto uma gota de água
no mar, seria preciso que ele pudesse conhecê-la e agir sobre ela. Em todos os
domínios, é verdade, as forças coletivas ultrapassam infinitamente as forças
individuais, assim não se pode mais facilmente conceber um individuo dispondo
mesmo de uma porção de vida coletiva do que uma linha se esticando com o
acréscimo de um ponto. Essa é ao menos uma aparência, mas na realidade a uma
exceção e só uma, a saber, o domínio do pensamento. No que concerne ao
pensamento, a relação é invertida; ai o individuo supera a coletividade mais do
que qualquer outra coisa, pois o pensamento só se forma num espírito que se encontra só diante de si mesmo; as
coletividades não pensam. (p.123)
Numa sociedade fundada sobre opressão,
não são somente os fracos, mas também os mais poderosos que estão subjugados às
exigências cegas da vida coletiva, e há uma diminuição do coração e do espírito
tanto entre como entre outros, ainda que de modo diferente; ora, se comparar
duas camadas sociais opressivas tais como, por exemplo, os cidadãos de Atenas e
burocracia soviética, encontra-se uma distancia pelo menos tão grande quanto
entre um de nossos operários qualificados e o escravo grego.Quanto as condições
segundo as quais o pensamento tem mais ou menos espaço no exercício do poder, seria
fácil obedecê-las conforme o grau de complicação e extensão das questões, o
caráter geral das dificuldades a resolver e as repartições das funções. Assim,
os membros de uma sociedade opressiva não se distinguem somente conformar um
lugar mais alto ou mais baixo em que se encontram instalados no mecanismo
social, mas também pelo caráter mai consciente ou passivo de suas relações com
ele, e essa segunda distinção, mais importante que a primeira, não tem ligação
direta com ela. Quanto à influencia que os homens encarregados das funções
sociais submetidas à direção de sua
própria inteligência podem exercer sobre a
sociedade da qual fazem parte, ela depende, certamente, da natureza e da
importância dessas funções; (p.123)
Se as análises precedentes estão
corretas, a civilização mais plenamente humana seria aquela que tivesse por um
centro o trabalho manual, aquela que o trabalho manual constituísse o
verdadeiro valor. Não se trata de nada parecido com a religião da produção que
reinava da América durante o período de prosperidade, que reina na Rússia desde
o plano qüinqüenal; pois essa religião tem por objetivo verdadeiro o produto
verdadeiro o produto do trabalho manual deve se tornar o mais alto valor, mas
por sua relação com homem o que executa; ele não deve ser objeto de horas ou
recompensas, mas construir para cada ser humano aquilo de que ele tem
necessidade essencialmente para que sua vida tenha por si mesma um sentido e um
valor a seus próprios olhos. (p.130)
O pensamento é a sua suprema dignidade
do homem; mas ele se exerce no vazio e em consequência apenas em aparência,
quando não penetra seu objeto, ou qual só pode ser o universo. Ora, o que
proporciona às especulações abstratas
dos sábios essa relação com o universo,que é a única que lhes dá um valor
concreto ,é o fato que elas são diretas ou indiretamente aplicáveis. Hoje em
dia, é verdade, suas próprias especulações as tornam estranhas; aqueles que
elaboram ou estudam essas especulações fazem-no sem pensar em seu valor teórico. (p.131)
Jamais o individuo esteve tão
completamente entregue a uma coletividade cega, e jamais os homens foram mais
incapazes não somente de submeter suas ações e seus pensamentos, mas até mesmo
de pensar. Os termos “opressores” e “oprimidos”, a noção de classes, tudo isso
está bem perto de perder qualquer significado, de tão evidentes que são a
impotência e a angustia de todos os homens e diante da maquina social,
transformada uma maquina de partir corações, de engasgar os espíritos, uma
maquina de fabricar inconsciência, tolice, corrupção, leviandade e sobretudo
vertigem. A causa desse doloroso estado de coisas é bem clara. Vivemos num
mundo em que nada está na medida do homem; há uma desproporção monstruosa entre
o corpo do homem, o espírito do homem e as coisas que constituem atualmente os
elementos da vida humana; tudo é desequilíbrio. (p.135)
Tantas mudanças profundas operam-se quase
sem o sabermos, e no entanto vivemos um período em que até o eixo do sistema
social está, por assim dizer, em vias de se deslocar. No decorrer de todo
florescimento do regime industrial a vida social encontrou-se orientada do
sentido da construção. O equipamento industrial do planeta era por excelência o
terreno sobre o qual se dava a luta pelo poder. Fazer crescer um empresa mais
rápido que suas rivais, e isso com seus próprios recursos, tal era em geral o
fim da atividade econômica. A poupança era a regra da vida econômica;
restringia-se ao máximo o consumo não somente dos operários, mas também dos
capitalistas, e de uma maneira geral, todos os gastos que tendessem a outra
coisa que não o equipamento industrial. Os governos tinham antes de tudo por
missão preservar a paz civil e internacional. Os burgueses tinham a sensação
que seria assim indefinidamente para a maior felicidade da humanidade; mas não
podia ser assim definidamente. Hoje em dia, a luta pelo poder, guardando numa
certa medida a aparência das mesmas formas, mudou completamente de natureza. (p.142)
A única possibilidade de salvação
consistiria numa cooperação metódica de todos, poderosos e fracos, em vista de
uma descentralização progressiva da vida social; mas o absurdo de uma tal idéia
salta imediatamente aos olhos .Tal cooperação não pode se imaginar mesmo em
sonho numa civilização que repousa sobre a rivalidade, a luta, a guerra. Fora
de tal cooperação, em impossível interromper a tendência cega da maquina social
em direção a uma centralização crescente, até a própria maquina trave brutalmente
e voe em pedaços. Que pode pesar os desejos e votos daqueles que não estão nos
postos de comando, enquanto que, reduzidos a impotência mais trágica, eles são
os simples joguetes de forças cegas e brutais? (p.148)
Conclusão
Que
será realmente que parecerá e o que subsistirá da civilização atual? Em que
condições, em que sentido a história se desenrolará daqui pra frente? Essas
questões são insolúveis. O que sabemos de antemão é que a vida será tão menos
desumana quanto maior for a capacidade individual de pensar e agir. A
civilização atual, da qual nossos descendentes recolherão sem duvida alguns
fragmentos de herança, carrega, nós o sentimos bem, os meios de esmagar o
homem; mas ela contem também, ao menos em germe, os meios de libertá-lo. Há em
nossa ciência, apesar de todos as obscuridades
que induz de nova escolástica, clarões admiráveis, partes límpidas de
luminosas ,procedimentos perfeitamente metódicos do espírito. Em nossa técnica
também há germes de libertação do trabalho. Não sem duvida, como se acredita
comumente, do lado das máquinas automáticas; estas mostram-se apropriadas, do
ponto de vista puramente técnico ,para desincumbir os homens daquilo quem o
trabalho pode ter de maquinal e de inconsciente, mas em compensação elas estão
indissoluvelmente ligadas a uma organização de economia centralizada ao excesso,
e por consequência muito opressiva. (p.151)
5
Fragmentos
(1933-1838)
I
A situação em que nos encontramos é de
uma gravidade sem precedente. O proletariado mais avançado, melhor organizado do
mundo não somente foi vencido, mas capitulou sem resistência. É a segunda vez
em vinte anos. Durante a guerra, nossos antepassados ainda puderam esperar que
o proletariado russo,com seu magnífico levante ,fosse despertar os operários
europeus. Para nós, nada permite formar uma opinião semelhante; nenhum sinal
anuncia em parte alguma uma vitoria capaz compensar o esmagamento sem combate
dos operários alemães. Jamais talvez, desde que existe um movimento operário, a
relação de força foi tão desfavorável ao proletariado quando hoje ,cinqüenta
anos depois da morte de Marx.
Que resta Marx, cinqüenta anos depois
de sua morte? Sua doutrina não é destrutível; qualquer pode procurá-la em suas
obras e assimilá-la, repensando-a; e embora vulguem hoje em dia, com o nome de
marxismo, algumas formas ressecadas d e desprovidas de significação real, alguns
militantes remontam às fontes. Mas, embora as análises de Marx tenham um valor
que não pode parecer, o objeto dessas analises, a saber a sociedade
contemporânea e Marx, não é mais .O marxismo não pode viver a não ser com uma
condição: que o precioso instrumento que constitui o método marxista passe de
geração em geração sem se enferrujar, cada
geração servindo-se dele para definir o mundo em que vive. (p.155 e 156)
6
Exame
crítico das idéias de Revolução de Progresso*
Tem-se uma idéia estranha da revolução examinando a coisa de perto.
Aliás, dizer que há uma idéia já é muito. Em que os revolucionários acreditam
poder reconhecer o momento que haverá revolução? Na instalação no governo de um
certo grupo? Na violação da legalidade? Em algumas estatizações? Na emigração
maciça dos burgueses? Na promulgação de um decreto suprindo a propriedade privada?
Tudo isso não está claro. Mas enfim resta que se espere, sob o nome da
revolução, um momento em que os últimos serão os primeiros, onde os valores
negados ou rebaixados pelo regime atual surgirão em primeiro plano, onde os
escravos, aliás sem abandonar sua tarefas, serão os únicos cidadãos, onde as
funções sociais votadas hoje à submissão, à obediência e ao silêncio terão em primeiro lugar o direito à palavra e
à deliberação em todas as questões de interesse
público. Não se trata de profecias religiosas. Apresenta-se um tal
futuro como correspondendo ao curso normal da história. Mesmo que a tenhamos
estudado, permanecemos penetrados pela lembrança vaga dos manuais da escola
primárias e das cronologias. (p.
171)
7
Meditação sobre a obediência e a liberdade
A submissão do maior número ao menor,
esse fato fundamental de quase toda organização social ,nunca deixou de
surpreender a todos aqueles que refletem um pouco. Vemos, na natureza, os
maiores pesos vencerem os menores pesos, certamente, por uma experiência quotidiana,
que o homem não é um simples fragmento da natureza, que o que há mais elevado
no homem, a vontade, a inteligência, a fé, produz todos os dias uma espécie de
milagre. Mas não é disso que se trata. A necessidade impiedosa que manteve e que
mantém de joelhos as massas de escravos, as massas de pobre, as massas de
subordinados, nada tem espiritual; ela é
análoga a tudo que há de brutal na natureza. E no entanto ela se exerce
aparentemente em virtude de leis contrárias às da natureza. Como se, na balança
social, o grama superasse o quilo.
(p.175)
Uma vez que a maioria obedece, e obedece até
se deixar impor o sofrimento e a morte, enquanto a minoria comanda, é que não é
verdade que a minoria seja uma força. A maioria, seja o que for que a
imaginação nos leve a acreditar, é uma fraqueza. A fraqueza está do lado em que
se tem fome, onde os homens se esgotam, suplicam, tremem, não do lado em que se vive bem, onde
concedem graças, onde se fazem ameaças. O povo não é submisso apesar de ser
a maioria, mas porque é a maioria.
A contradição talvez não seja senão
aparente. Sem duvida, em toda ocasião ,aqueles que ordenam são menos numerosos
dos que os que obedecem. Mas precisamente porque são poucos numerosos, eles
formam um conjunto. Os outros, precisamente porque são muitos numerosos, são um
mais um ,e assim por diante. Assim o poder de uma ínfima minoria repousa,
apesar de tudo ,sobre a força do numero. Essa minoria supera em muito, em
números cada um daqueles que compõe o rebanho da minoria .Não se deve concluir
disso que a organização das massas inverteria a relação; pois ela é impossível
.Não se pode estabelecer coesão senão entre uma pequena quantidade de homem.
Alem disso, não há mais do que justaposição de indivíduos, isto é,fraqueza.
Há, entretanto, momentos em que não é bem
assim. Em alguns momentos da história, um grande sopro passa sobre as massas;
sua respiração, suas palavras, seus movimentos se confundem. Então nada lhe
resiste. Os poderosos, por sua vez, conhecem afinal o que é sentir-se só e
desarmado; e eles tremem. (p.178)
A
força social não funciona sem mentira. Assim, tudo o que há demais alto na vida
humana, todo esforço de pensamento, todo esforço de amor é corrosivo para a
ordem. O pensamento pode também, com toda a razão, ser difamado como
revolucionário, de como. Pelo fato de que constrói sem acessar uma escala de
valores “que não é deste mundo”, ele é inimigo das forças que dominam a
sociedade. Mas ele não é mais favorável às iniciativas que tentem a subverter
ou transformar a sociedade, e que, antes mesmo de ter tido sucesso devem
necessariamente implicar, entre aqueles que a essa se dedicam, a submissão do
maior numero ao menor, o desprezo dos privilegiados pela massa anônima e a manipulação
da mentira. O gênio, o amor, a santidade merecem plenamente a acusação que
muitas vezes é feita de tender a destruir tudo aquilo e nada construir no
lugar. Quanto àqueles que querem pensar, amar e transpor em toda a pureza para
a ação política aquilo que lhes inspiram seu espírito e seu coração, eles não
podem senão parecer degolados, abandonados pelos seus, difamados após sua morte
pela história, como se aconteceu com os Gracos.
A ordem social, embora necessária, é
essencialmente má, qualquer que seja. Não se pode acusar aqueles que ela esmaga
de miná-la tanto quanto podem; quando eles se resignam, não é por virtude, mas,
ao contrário ,é pelo efeito de uma humilhação que extingue neles as virtudes
viris. Não se pode também aqueles que à organizam de defendê-la nem representá-los, como formando uma
conjuração contra o bem geral. As lutas entre cidadãos não resultem de uma
falta de compreensão ou de boa vontade; elas tem a ver com a natureza das
coisas, e não podem ser apaziguadas, mas apenas abafadas pelo constrangimento.
Para qualquer um que ame a liberdade, não é desejável que aqueles desapareçam,
mas somente que permaneçam aquém de um certo limite de violência. (p.181 e 182)
9
Fragmentos
(Londres, 1943)
I
O verdadeiro caminho existe. Platão e
muitos outros percorreram. Mas ele não está aberto senão àqueles que,
reconhecendo-se incapazes de encontrá-lo, não e procuram mais, e no entanto não
deixam de desejá-lo acima de qualquer coisa. Àqueles é conceito nutrir-se de um
bem que, estando situado fora desse mundo, não está submetido a nenhuma
influencia social. É o pão transcendente
de que se trata no texto original do Pai-Nosso. (p.194)
A contradição essencial da condição
humana é que o homem está submetido à força, e deseja a justiça. Ele está
submetido à necessidade, e deseja o bem. Não é só seu corpo que está assim
submetido, mas também todos os seus pensamentos; e no entanto o próprio ser do
homem consiste em está voltado para o
bem. É por isso que acreditamos que há uma unidade entre a necessidade e o bem.
Alguns acham que o pensamento do homem concernente ao bem possui aqui o mais
alto grau de força. São aqueles que chamamos de idealistas. Eles se enganam
duplamente, primeiro porque esses pensamentos não têm força, e depois porque
eles não correspondem ao bem. Eles são influenciados pela força; de modo que
essa atitude é finalmente uma réplica menos energética da atitude contrária.
Outros acreditam que a força é por si mesma orientada para o bem. São idólatras.
Eis aí a crença de todos os materialistas que não caem no estado de
indiferença. Eles também se enganam duplamente primeiro, a força é estranha e
indiferente ao bem, depois ela não é sempre de por toda parte mais forte. Só
podem escapar desses erros aqueles que recorrem ao pensamento incompreensível
de que uma unidade entre a necessidade e o bem, ou, em outras palavras entre a
realidade e o bem ,fora deste mundo. Aqueles acreditam também que alguma dessa unidade
se comunica com os que voltam para ela sua atenção e seu desejo. Pensamento
ainda mais incompreensível, mas experimentalmente verificado. (p.197)
Os fatos mostram que quase sempre os
pensamentos dos homens são moldados, como pensava Marx, pelas mentiras da moral
social. Quase sempre, mas não sempre. Isso também é certo. Há vinte e cinco
séculos, alguns filósofos gregos, cujo nomes mesmo são desconhecidos, afirmam
que a escravidão é absolutamente contrária à razão e à natureza. Tanto as
flutuações da moral conformes os tempos e os países são evidentes, como também é evidente que a
moral que procede diretamente da mística é uma, idêntica, inalterável. Podemos
verificá-lo considerando o Egito, a Grécia, a Índia, a China, o budismo, a
tradição mulçumana, o cristianismo, e o folclore de todos os países. Essa moral
é inalterável porque é um reflexo do bem absoluto que está situado fora deste
mundo. É verdade que todas as religiões, sem exceção, fizeram misturas impuras
dessa moral e da moral social, com dosagens variáveis. Nem por isso ela
constitui a prova experimental, aqui embaixo, de que o bem puro é transcendente
é real; em outros termos, a prova experimental da existência de Deus. (p.198)
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