(Material elaorado pelo prof. Paolo Cugini)
A
este ponto, porém, a inteligência humana se entrega, forçada a se perguntar como é possível
explicar que, a partir do momento que Deus sempre existiu, também as criaturas
sempre existiram; e que existiram, por assim dizer, sem ter tido início, as
criaturas que sem dúvida devemos crer
que foram criadas e feitas por Deus. Visto que, aqui entram contraste entre si
as idéias dos homens, enquanto de ambas as partes se opõem e contrastam
conceitos validíssimos que procuram atrair a si aquele que os considera, eis o
que, segundo a limitadíssima capacidade da nossa inteligência, nos vem à mente,
e que pode ser declarado sem nenhum perigo para fé. Deus sempre foi Pai, e
sempre teve o Filho unigênito, que, conforme tudo o que expusemos acima, é
chamado também de sabedoria: esta é sabedoria com a qual Deus sempre se
alegrava tendo criado o mundo (PROVËRBIOS 8, 30ss), motivo pelo qual também
entendemos que Deus sempre se alegra. Ora, nesta sabedoria, que sempre estava
com o Pai, estava sempre contida, preordenada sob a forma de idéias, a criação,
de modo que não houve momento em que a idéia daquilo que teria sido criado não
estivesse na sabedoria. Parece-me que talvez desse modo nós, nos limites da
nossa pequenez, possamos pensar Deus de modo ortodoxo, pois não dizemos que as
criaturas são não-geradas e coeternas com Deus,
e por outro lado nem que Deus, antes nada tendo feito de bom, tenha
começado a operar depois de uma mudança, a partir do momento que é verdadeiro o
que foi escrito: “Tudo fizeste na sabedoria” (Salmo 103, 24). E se tudo foi
feito na sabedoria, pois a sabedoria sempre existiu, pré-constituídos sob a
forma de idéias sempre existiam na sabedoria os seres que sucessivamente teriam
sido criados também segundo a substância. Penso que pensando justamente nisso
Salomão diz no Eclisiastes: “O que foi feito? O mesmo que será feito; o que foi
criado? O mesmo que será criado. Não há nada de novo sob o sol. E se alguém
disser: ‘Eis, isto é novo sob o sol. E se alguém disser: ‘Eis, isto é novo’,
isso já existiu nos séculos que existiram antes de nós”. (Eclesiastes 1, 9ss).
Portanto, se tudo isso que existe sob o sol existiu já nos séculos que se
passaram antes de nós, pois não há nada de novo sob o sol, sem dúvida sempre
existiram todas as coisas, os gêneros e as espécies, e poderíamos dizer também
aquilo que é numericamente uno. (Orígenes, Os princípios, livro I, 4, 4-5)
O fim do mundo
é prova de que todas as coisas chegaram à plena realização. Este fato nos
lembra que se alguém é tomado pelo desejo de ler e conhecer argumentos tão
árduos e difíceis deverá ter inteligência cultivada e completa. Com efeito, se
ele não tiver tido certa experiência de questões de tal gênero, estes
argumentos lhe parecerão inúteis e supérfluos (...).
O fim do mundo
ocorrerá quando cada um for submetido às penas conforme os próprios pecados
(Mateus 24, 36); e somente Deus conhece o tempo em que cada um receberá aquilo
que merece. Consideremos todavia que a bondade de Deus por obra de Cristo
conduzirá todas as criaturas para um fim único, depois de ter vencido e
submetido também as adversários. Com efeito, assim diz a escritura: “Disse o
Senhor ao meu Senhor: Senta-te à minha direita até que eu ponha teus inimigos
como escabelo de teus pés”. (Salmo 10, 1). Se não parece claro aquilo que a
palavra do profeta quer dizer, aprendamos mais abertamente de Paulo, que diz:
“É preciso que Cristo reine até que tenha posto todos os seus inimigos sob seus
pés”. (I Coríntios 15, 25). E se nem estas palavras tão evidentes do apóstolo
nos esclarecem suficientemente o que significa pôr os inimigos sob os pés, ouve
como ele continua: “Com efeito, é preciso que tudo lhe seja submetido”. (I
Coríntios 15, 27). Mas o que é a submissão pela qual tudo deve estar submetido
a Cristo? creio que seja aquela pela qual também nós desejamos estar submetidos
a ele, pela qual se lhe submetem os apóstolos e todos os santos que o seguiram:
com efeito, submissão pela qual estamos submetidos a Cristo significa salvação
que Cristo dá a seus submetidos, conforme tudo o que dizia também Davi: “Não
estará minha alma submetida a deus? com efeito, dele vem minha salvação”.
(Salmo 61, 1)
Observando tal
fim, em que todos os inimigos serão submetidos a Cristo e também será destruído
o último inimigo, a morte, e Cristo, a quem tudo foi submetido, entregará o
reino a Deus pai (I Coríntios 15, 24ss), disso conhecemos o início das coisas.
Com efeito, o fim é sempre semelhante ao início: e como um só é o fim de tudo,
assim devemos entender um só início de tudo, e como um só é o fim de múltiplas
coisas, assim, de um só início derivaram coisas muito variadas e diferentes,
que de novo, pela bondade de Deus, a submissão de Cristo e a unidade do
Espírito Santo são reconduzidas a um só fim, que é semelhante ao início (...).
Devemos crer
que toda esta nossa submissão corpórea será tirada de tal condição quando cada
coisa for reintegrada para ser uma só coisa (João 17, 21), e Deus será tudo em
todos (I Coríntios 15, 28). Isso, porém, não acontecerá em um momento, mas
lenta e gradualmente, através de séculos infinitos, pois a correção e a
purificação sucederão pouco a pouco e singularmente, e enquanto alguns com
ritmo mais veloz se apressarão em primeiro lugar para a meta e outros os
seguirão de perto, outros, ao contrário, permanecerão muito atrás. E assim,
mediante inumeráveis ordens constituídos por aqueles que progridem e, de
inimigos que eram, se reconciliam com deus, chega-se ao último inimigo, a
morte, para que também este seja destruído e não haja mais inimigo (I Coríntios
15, 26).
Quando todas
as almas racionais forem reconduzidas a esta condição, então também a natureza
deste nosso corpo será levada à glória de corpo espiritual. Com efeito, como
vemos que das naturezas racionais as que mereceram a bem-aventurança não são de
natureza diferente em relação às que
viveram na indignidade do pecado, mas são as mesmas, que antes pecaram e
depois, convertidas e reconciliadas com Deus,
foram novamente chamadas à bem-aventurança: da mesma forma, também sobre
a natureza do corpo não devemos crer que um corpo é este de que agora usamos na
ignomínia, na corruptibilidade e na fraqueza, e outro será aquele do qual
faremos uso na incorruptibilidade, no poder e na glória; mas será sempre este
mesmo corpo que, deixando estas imperfeições de agora, será transformado na
glória e se tornará corpo espiritual, de modo que tendo sido vaso para uso
vulgar, uma vez purificado se tornará vaso de luxo (Romanos 9, 21), receptáculo
de bem-aventurança. E devemos crer que nesta condição permanecerá sempre e
imutavelmente por vontade do Criador, segundo a fé de Paulo que diz: “Temos uma
habitação não feita por mão de homens, eterna nos céus” ( II Coríntios 5,
1).
(Orígenes, Os princípios, livro III, 6)
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