A metafísica é o ramo da filosofia que, indo além dos
elementos contingentes da experiência sensorial, trata dos aspectos mais
autênticos e fundamentais da realidade, segundo a perspectiva mais ampla e
universal possível. Visa estudar os entes "como tais" em sua
totalidade; por exemplo, Aristóteles a definiu como "a ciência do ser
enquanto ser" (Metafísica, livro Γ, cap. I, 1003 a, 21-26), independentemente de suas
determinações ou atributos.
Na tentativa de superar os elementos instáveis,
mutáveis e acidentais dos fenômenos, a metafísica concentra sua atenção
naquilo que considera eterno, estável, necessário, absoluto, para tentar
apreender as estruturas fundamentais do ser. Nessa perspectiva, as relações
entre metafísica e ontologia são muito estreitas, tanto que, desde a
antiguidade, tem sido costume encerrar o significado da metafísica na busca
incessante por uma resposta à questão metafísica fundamental "por que o
ser em vez do nada?".
O campo da pesquisa metafísica tradicional inclui
problemas como a questão da existência de Deus, a imortalidade da alma, o ser
"em si", a origem e o significado do cosmos, bem como a questão da
possível relação entre a transcendência do Ser e a imanência das entidades
materiais (diferença ontológica).
Etimologia
Aristóteles, reconhecido como o pai da
"metafísica", embora nunca tenha utilizado esse termo.
O termo metafísica (em grego antigo: μετὰ τὰ φυσικά, metà tà physikà) deriva da catalogação dos livros de
Aristóteles na edição de Andrônico de Rodes (século I a.C.), na qual, após o
tratamento da natureza, que era a física (τὰ φυσικά), seguiu-se o da "filosofia primeira" (πρώτη φιλοσοφία) ou teoria do "ser como ser". O termo ser
corresponde, simplesmente, ao particípio presente do verbo ser.
Como esses volumes foram então colocados após (μετά, metá) aqueles sobre física, tanto no sentido da
ordem de publicação quanto no de importância, metafísica teria passado a
significar "as coisas que vêm depois das coisas da física", isto é,
os livros que seguem aqueles sobre a natureza. O prefixo meta-, no entanto,
também assume o significado de "além", "acima",
"acima": nesse sentido, no pensamento árabe medieval, aos objetos da
"filosofia primeira" era atribuído um valor de transcendência e
superioridade em relação aos objetos da física sublunar. Então, a partir de um
título que designava os textos colocados após aqueles sobre física, o termo
metafísica teria se tornado o nome de uma parte da filosofia.
O historiador da filosofia Giovanni Reale contesta a
reconstrução lógica e cronológica da etimologia do termo "metafísica"
com base no duplo significado do prefixo grego meta. A tese de Reale é que,
entre os dois significados de meta, o relativo ao conceito de
"sucessão" (ou "depois") é irrelevante e secundário, pois
não foi levado em conta que toda a doutrina aristotélica diz respeito àquele
princípio de "unidade do ser" (ou Ser como ser) que vai
"além" (ou "acima") da física, e este é o único significado
primário que para ele o termo meta deve assumir.
Os fundamentos da metafísica
Um dos objetivos desta disciplina é estudar os
primeiros princípios de uma perspectiva qualitativa, diferentemente da
matemática, que estuda sua quantidade, ou da física, que estuda seu aspecto
natural. O objetivo final é, portanto, a verdade em si mesma.
Os limites da experiência sensorial
O pressuposto da metafísica é a investigação dos
limites e possibilidades de um conhecimento que não pode derivar diretamente da
experiência sensorial. Os cinco sentidos, de fato, limitam-se a receber
passivamente as impressões derivadas dos fenômenos naturais dentro de uma
estreita faixa de percepções e, portanto, não são capazes de fornecer uma lei
capaz de descrevê-los, ou seja, não são capazes de apreender sua essência.
O objetivo da metafísica, nesse sentido, é a tentativa
de encontrar e explicar a estrutura universal e objetiva que se supõe estar
oculta por trás da aparência dos fenômenos. Surge, portanto, a questão de saber
se tal estrutura, além de determinar a realidade, é capaz de determinar nossa
própria maneira de conhecer, por meio de ideias e conceitos que correspondem à
realidade.
Segundo essa linha de interpretação, somente em nosso
intelecto é possível formular aqueles critérios de racionalidade e
universalidade que nos permitem conhecer o mundo: a simples "sensação em
ação", de fato, "tem como objeto coisas particulares, enquanto a
ciência, ao contrário, tem como objeto universais, e estes se encontram, em
certo sentido, na própria alma". Eis, então, a oposição radical, típica
dos grandes filósofos metafísicos, desde Parmênides, Sócrates, Platão,
Aristóteles, até Agostinho, Tomás, Cusano, Campanella etc., entre o
conhecimento adquirido pelos sentidos e o conhecimento próprio do intelecto.
Segundo essa escola de pensamento, portanto, não pode
haver conhecimento verdadeiro se ele não brotar da inteligência, que, no
entanto, para ser ativada, deve primeiro tomar consciência de si mesma: se o
intelecto fosse incapaz de pensar por si mesmo, não poderia sequer tomar
consciência da verdade, nem ter consciência de jamais poder alcançá-la. O
pensamento de si, portanto, tem sido frequentemente tomado como ponto de
partida, partindo de sua capacidade de tornar possível o conhecimento imediato,
universal e absoluto, pois nele o sujeito é imediatamente idêntico ao objeto,
sendo o eu que se intui.
Pelo menos até Descartes, de onde o tema da
autoconsciência será retomado em uma dimensão mais puramente subjetiva e
psicológica, a intuição cognitiva de si permanecerá conectada à questão
ontológica preponderante de um Ser a ser colocado no fundamento de sua essência
íntima. Mesmo na filosofia moderna, porém, não faltam casos, por exemplo em
Spinoza, Leibniz, Fichte, em que, de tempos em tempos, a subjetividade é
vinculada a temas ontológicos.
Em geral, a intuição, ou apercepção, tem sido colocada
como a origem e o objetivo de toda metafísica, e considerada superior tanto ao
pensamento racional quanto ao conhecimento empírico: o pensamento racional
baseia-se, de fato, em uma forma mediada de conhecimento, na qual o sujeito
chega a apreender o objeto somente após um cálculo ou uma análise racional, e
onde, portanto, ambos são separados; Da mesma forma, o conhecimento empírico é
mediado pelos sentidos e, portanto, nele, mais uma vez, sujeito e objeto são
separados.
Em vista disso, é compreensível como a maioria dos
filósofos metafísicos postulou uma diferença não apenas entre consciência e
percepção sensível, mas também entre intelecto e razão. O intelecto é o lugar
onde a intuição é propriamente produzida e, portanto, é superior à razão por
ser o primeiro princípio sem o qual não haveria conhecimento de nada; enquanto
a razão é apenas um instrumento, um meio que permite comunicar e abordar
discursivamente a visão intuitiva do universal.
A relação com a teologia
Como a metafísica "...visa identificar a natureza
última e absoluta da realidade, para além de suas determinações
relativas...", ela tem sido frequentemente atribuída a um caráter místico
e religioso, de tensão em direção ao absoluto, a Deus e à transcendência.
Já com Aristóteles, a metafísica é a ciência do ser
perfeito, isto é, o estudo de Deus: uma vez que buscava as causas primeiras da
realidade, tornou-se também uma investigação de Deus. A estreita ligação com a
teologia permanecerá válida por quase toda a Idade Média. Nesse sentido, é
fundamental a contribuição de Tomás de Aquino, que identificou a metafísica com
a teologia filosófica e, portanto, considerou possível uma síntese entre razão
e fé.
De alguns pontos de vista, a Idade Média termina
quando a intuição se separa da razão, quando a metafísica e a teologia tendem a
ser vistas como disciplinas separadas. Alguns filósofos, incluindo Descartes e
Hegel, tentarão construir uma autonomia da razão, tornando-a independente da
intuição.
A relação com a ontologia
As relações com a ontologia também são variáveis. Ao
longo da história do pensamento, filósofos atribuíram a esta disciplina
significados, características e funções diferentes da metafísica: ora a
ontologia foi entendida como parte da metafísica, concebendo-a como uma espécie
de descrição geral do ser, preparatória para as demais disciplinas metafísicas;
ora elas foram substancialmente coincididas, negando à metafísica qualquer
autonomia; ou uma nova ontologia capaz de revelar as verdadeiras estruturas do
ser foi oposta à metafísica tradicional.
Segundo Varzi, a ontologia antecede a metafísica: «a
ontologia ocupar-se-ia de estabelecer o que existe, ou de elaborar uma espécie
de inventário de tudo o que existe, enquanto a metafísica ocupar-se-ia de
estabelecer o que é aquilo que existe, ou de especificar a natureza dos artigos
incluídos no inventário». Segundo Mondin, a metafísica consiste na busca das
causas últimas da realidade, sendo, portanto, essencialmente etiologia,
enquanto a ontologia seria apenas um estudo da «fenomenologia» do ser tal como
se revela.
Monismo, Dualismo, Pluralismo
Um dos problemas clássicos da metafísica é a disputa
entre a concepção monista do ser e a concepção dualista. Os defensores do
dualismo, dos quais Descartes é um exemplo clássico, concebem a realidade
segundo uma dicotomia entre o mundo material e o mundo espiritual (o que, no
homem, corresponderia à distinção radical entre corpo e alma). Os monistas, dos
quais Spinoza é um exemplo, sustentam que a realidade pode ser rastreada até
uma única substância. Finalmente, podemos incluir os defensores da pluralidade
de planos ontológicos: um exemplo relativamente recente é Karl Popper com sua
teoria do Mundo 1, Mundo 2 e Mundo 3.
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