Giovanni Reale, História da filosofia antiga
Síntese: Paolo Cugini
1. Significado do termo “sofista”
São dois os pontos de acusação, e, de natureza diferente: a) a sofistica é um saber aparente e não real e, além disso, ela: b) é professada com fins lucrativos e de modo algum por desinteressado amor á verdade.
A estas acusações, aduzidas por filósofos, acrescentaram-se depois também as que surgiram da opinião publica. Esta viu nos sofistas um perigo, seja para a religião (como de resto o viu nos últimos físicos), seja para o costuma moral, dado que, justamente, para este domínio os sofistas deslocam a sua atenção. Os aristocratas em particular não perdoaram os sofistas por terem contribuído para a sua perda de poder e por terem dado forte incentivo á formação de uma nova classe, que não se valia mais da nobreza de nascimento, mas dos dotes e habilidades pessoais, e que era, justamente, aquela classe que os sofistas pretendiam criar ou, pelo menos, educar sistematicamente.
2. Razões do surgimento da sofística
Para compreender o surgimento e o desenvolvimento do fenômeno da sofistica, é preciso ter presentes os resultados aos quais chegou à especulação naturalista. Estes tinham então chegado ao ponto de se anularem mutuamente: os resultados do eleatismo contradiziam os do heraclitismo; os resultados dos pluralistas contradiziam os dos monistas; ulteriormente, as soluções dos pluralistas se excluíam mutamente, se não nos fundamentos, pelo menos na determinação do pensamento. Parecia, então, que todas as possíveis soluções tinham sido propostas e não eram pensáveis outras: para os sofistas o homem e suas criações espirituais estão no centro da reflexão. Com os sofistas, começa aquele que, com expressão correta, foi chamado de período humanista da filosofia antiga.
3. O método indutivo da pesquisa sofística
A sofística tem seu ponto de partida na experiência e tenta ganhar o maior número possível de conhecimento em todos os campos da vida, dos quais, extrai algumas conclusões. Ela procede, portanto, segundo o modo empírico-indutivo”.
4. Finalidades práticas da sofística
os sofistas não buscam a verdade por si mesma, mas tinham por objetivo o ensinamento, e o fato de terem discípulos era, para eles, essencial, os sofistas faziam do seu saber uma verdadeira profissão. Contra a pretensão da nobreza, que sustentava ser a virtude uma prerrogativa da nascimento e de sangue, os sofistas pretenderam fazer valer o principio segundo o qual todos podem adquirir a Arete, e esta, mais que na nobreza de sangue, funda-se sobre o saber.
6. O iluminismo da sofística grega
Eles subverteram nas velhas concepções da physis nas quais o pensamento ameaçava cristalizar-se, criticaram a religião tradicional, abalaram os pressupostos aristocráticos sobre os quais se fundava a política passada, abalaram as instituições esclerosadas, contestaram a tradicional tábua de valores que então era defendida sem convicção. Essa liberdade de espírito e essa liberação espiritual de todas as tradições que foram próprias dos sofistas valeram-lhes o epíteto de “iluministas gregos”.
7. As diferentes correntes da sofística
É impossível reduzir o pensamento dos vários sofistas a proposições comuns, a sofística do século V representa um complexo de esforços independentes para satisfazer, com meios análogos, necessidades idênticas. A sofistica, sofreu uma evolução, antes, uma evolução muito marcada, e entre os mestres da primeira geração e os discípulos da segunda geração existe uma diferença notável.
O principio do “homem-medida”
A proposição fundamental de Protágoras, foi o axioma: “o homem é a medida de todas as coisas, das que são pelo que são, e das que não são pelo que não são”. O homem do qual Protágoras fala é o individuo singular.
O princípio das duplas razões contraditórias e a sua aplicação
Protágoras afirmava que “em torno a cada coisa existem dois raciocínios que se contrapõem entre si”, o seu método será, essencialmente a antilogia ou a controvérsia, a oposição das varias teses possíveis sobre determinados temas, ou hipóteses, convenientemente definidas ou catalogadas; trata-se de ensinar a criticar e a discutir, a organizar um torneio de razões, ensinava os modos com os quais era possível sustentar e levar á vitória o argumento (qualquer que fosse o seu conteúdo) que, na discussão, em determinadas circunstâncias, podia resultar o mais frágil.
O ensino da “virtude” e o sentido deste termo
Astúcia (euboulía) é exatamente a habilidade no falar, sobretudo em público, diante dos tribunais e assembléias, e Protágoras a considera ensinável, justamente mediante a técnica da antilogia e a conseqüente técnica que mostra como fazer prevalecer qualquer ponto de vista sobre o oposto.
Limitação do alcance do princípio do “homem-medida”
Se é verdade que não existem valores morais absolutos e, portanto, um bem absoluto, toda-isso mais oportuno. O sábio é aquele que conhece o relativo mais útil, mais conveniente e mais oportuno, e sabe atuá-lo e fazê-lo atuar.
Fundo utilitarista da filosofia protagorian
Se o homem é medida do verdadeiro e do falso, não é, ao contrário, medida do útil e do prejudicial parece que, enquanto o homem é medida com relação á vontade e á falsidade, é medido com relação á utilidade: parece, pois, que ao útil deve-se reconhecer uma validade objetiva. O bem e mal são, respectivamente, o útil e o prejudicial; o melhor e o pior são o mais útil e o mais prejudicial. Protágoras sente-se perfeitamente autorizado a reintroduzir o conceito de sábio justamente com base no útil e com relação a ele. Os agricultores são sábios, enquanto conhecem o bem e o útil das plantas e sabem produzi-los; Mas o que é útil ao homem quem o determina, e em relação a que? Protágoras não hesita em dizer que quem o determina é justamente, o sofista; mas ele não sabe dizer em relação a que o sofista pode proceder a esta determinação.
Atitude de Protágoras acerca dos Deuses
A sua posição foi de agnosticismo teológico.
1. A negação da verdade
Górgias, parte de uma posição de miilismo sustentava três teses bem concatenadas entre si: a) não existe o ser, isto é, nada existe; b) mesmo que existisse o ser, ele não seria compreensível; c) e mesmo admitindo que fosse compreensível, ele não seria comunicável nem explicável aos outros. A demonstração das três proposições tem o preciso objetivo de excluir radicalmente a possibilidade da existência ou de se alcançar ou, pelo menos, exprimir uma verdade objetiva, para Górgias na existe absolutamente verdade e tudo é falso.
2. Nada existe
a) Que nada existe Gorgias o prova contrapondo entre si as concepções que os físicos sustentaram em torno do ser, que são tais a ponto de se anularem reciprocamente. Os resultados das especulações dos físicos sobre o ser se anulam mutuamente, e, anulando-se, demonstram o a impossibilidade daquele ser que têm por objetivo.
3. Mesmo que o ser existisse, permaneceria incognoscível
É Parmênides, de fato, o autor que afirmou como estruturalmente incindível o liame entre ser e pensar: o pensamento é sempre e somente pensamento do ser, de modo que, no limite, pode-se dizer que pensamento e ser são o mesmo, o não-ser é impensável e inexprimível justamente porque só o ser pensável e exprimível.
Górgias inverte estas duas bases do eleatismo. Contra o principio de que o pensamento é sempre e somente pensamento do ser, Górgias demonstra que existem pensados, ou seja, conteúdos de pensamento, que não tem qualquer realidade e, portanto, não existem:
Derrubado o primeiro principio, cai e o ipso também o segundo, que não é mais que uma face do primeiro, como o próprio Górgias perfeitamente observa que o não-ser não é pensável é também desmentido pela evidencia, porque nós podemos pensar Sila, a Quimera, e muitas outras coisas que não existem: se é verdade que existem não-existentes pensados, é também verdade o inverso, isto é, que o ser não é pensado; “Se o pensado não existe, o ser não é pensado”.
4. Mesmo que fosse pensável, o ser permaneceria inexprimível
c) A terceira tese é demonstrada por Górgias, contestando á palavra a sua capacidade de significar, de modo veritativo, qualquer coisa que seja diferente de si. Górgias, não se apresenta como mestre que ensina de modo especifico e expresso os supremos valores morais ele pressupõe que os seus alunos já possuam os comuns conhecimentos dos valores morais que têm todos os gregos.
5. A retórica e a onipotência da palavra
Se não existe uma verdade absoluta é claro que a palavra adquire a sua autonomia. Na sua independência ontológica, a palavra torna-se disponível a tudo. E, então, Górgias descobre, justamente no nível teórico, o aspecto da palavra pelo qual esta é portadora de sugestões e crenças. E a retórica é, exatamente, a arte que sabe explorar até o fundo este aspecto da palavra, e, portanto, pode ser chamado de a arte da persuasão, no taumatúrgico poder da palavra, capaz de persuadir a todos sobre tudo, parecia ter-se encontrado o instrumento insubstituível para dominar.
Mas a palavra, desancorada dos valores e, em geral, de toda verdade objetiva, podia se tornar perigosíssima.
6. A palavra e o engano poético
Também a arte, assim como o a retórica, não visa ao verdadeiro, mas á moção dos sentimentos; mas, enquanto a retórica, com a moção dos sentimentos, persegue fins práticos, visando gerar persuasões e crença em relação a questão éticas, sociais e políticas, a arte persegue fins além de teoricamente, também praticamente desinteressados.
VII. CONCLUSÕES SOBRE A SOFÍSTICA
A sofística operou um substancial deslocamento do eixo da pesquisa filosófica, centrando a sua problemática sobre o homem;.
E neste deslocamento do eixo está o valor substancial da sofística. Todavia, não se pode dizer que a sofística também tenha sabido fundar a filosofia moral. Todos os sofistas não souberam alcançar, no nível temático, o principio do qual todos dependem. Este principio, como sabemos, consiste na precisa, consciente e razoável determinação da essência do homem.
Os naturalistas criticaram a velha concepção antropomórfica dos deuses e identificaram Deus com o principio. Os sofistas rejeitaram os velhos deuses, os quais, depois da crítica naturalista, não eram mais dignos de fé; mas rejeitaram também a concepção do divino como principio das coisas, tendo rejeitado em bloco a pesquisa cosmo-ontológica. E assim aproximaram-se da negação de qualquer forma divino. Certamente, depois destas críticas, não se podia voltar atrás: para crer no divino era preciso buscá-lo e encontrá-lo numa esfera mais elevada.
E do divino passamos ao humano os sofistas destruíram, definitivamente, a visão que a tradição, sobretudo através dos poetas e dos legisladores, tinha construído. O homem, para se reconhecer, devia encontrar um mais sólido “ubi consistem”. Enfim a verdade. Antes do surgimento da filosofia, a verdade não era distinta das aparências. A palavra e o pensamento deviam recuperar a verdade num nível mais alto.
Mas se, para reencontrar o Divino e a verdade eram necessárias as descobertas metafísicas e lógicas de Platão e de Aristóteles, que estão decididamente além dos horizontes da sofística, para reconstruir um novo rosto do homem bastavam os recursos disponíveis no interior do horizonte da sofística: e essa foi a contribuição que Sócrates soube dar; e assim, com Sócrates, a sofística se concluiu e tornou-se verdadeiro, para usar uma expressão hegeliana, como agora veremos de modo claro.
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