terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

De Pitágora á Zenão. A escola Eleática

 





Giovanni Reale, História da filosofia antiga

Síntese: Paolo Cugini


A FÉ PITAGÓRICA: O HOMEM, A SUA ALMA E O SEU DESTINO

Critica da concepção dos Deuses e destruição do pressuposto da religião tradicional

O tema de fundo desenvolvido nos carmes de Xenófanes é cons-tituído sobretudo pela crítica da concepção dos deuses fixado de modo paradi-gmático por Homero e Hesído, esse erro consiste no antropomorfismo, convicção de que os deuses e o Divino em geral devem ter aspectos, forma, sentimentos, tendências totalmente iguais aos dos homens, portanto, os Deuses não têm e não podem ter semelhanças humana; mas é ainda menos pensável que tenham costumes humanos e, sobretudo, que cometem ações ilícitas e nefastas, como o diz a mitologia. E, analogamente, é impossível que os Deuses nasçam, porque se nascem também morrem. E é também impossível que Deus se mova e vaguei de um lugar a outro, como os Deuses erradios de Homero:

E, enfim os fenômenos celestes e terrestres, que as crenças populares identificam com as várias divindades, são explicados como fenômenos naturais, como por exemplo, o arco-íris, que se acreditava ser a deusa Íris: 

Depois das críticas de Xenófanes, o homem ocidental não poderá mais conceber o divino segundo formas e medidas humanas.

Deus e Divino segundo Xenófanes

Xenófanes chega a afirmar que Deus é cosmo.

Fragmento 23, Uno, Deus, sumo entre os deuses e os homens, nem por figura nem por pensamento semelhante aos homens, em primeiro lugar, ele é contrária ao espírito de toda a grecidade, ao qual, permaneceu sempre estranho o problema de se Deus é uno ou múltiplo. Em segundo lugar o verso de Xenófanes, ao mesmo tempo que fala de “Deus” no singular, compara-o e o põe acima dos Deuses no plural, o ver, ouvir e pensar, assim como a força que tudo faz vibrar, são atribuídos a Deus, não em dimensão humana, mas em dimensão cosmológica. Portanto Xenófanes não é monoteísta, porque fala tranquilamente de “Deus”, no singular e no plural, e porque nenhum grego jamais percebeu antítese entre monoteísmo; mas é um espiritualista, porque o seu Deus é o cosmo, e a categoria do espiritual está totalmente além do horizonte da sua especulação e não é, por conseqüência, nem sequer dualista. Se Xenófanes identificou Deus com o universo, continuou depois a falar também de Deuses sem determinar as relações destes com aquele, e sem determinar também as relações entre o Deus-cosmo e os eventos e fenômenos singulares do cosmo.

A física xenofanéia

Nalguns fragmentos, tudo nasce da terra, e tudo na terra termina.

Terra e água são todas as coisas que nascem e crescem. Todas nasceram da terra e da água, parece que Xenófanes, com a terra quis explicar somente os seres terrestres e não todo o cosmo: portanto o seu princípio é diferente do princípio dos jônicos, que pretendia explicar as coisas terrestres e todo o cosmo.

Idéias morais

Xenófanes expressou também idéias morais de alto valor, e em particular afirmou, combatendo os preconceitos correntes, a nítida superioridade daqueles que chamaremos valores espirituais, tais como a virtude, a inteligência, a sabedoria, sobre os valores puramente vitais, como a força física dos atletas.


As três vias da pesquisa

No seu poema, Parmênides parece ter atribuído três possível “vias” á pesquisa, uma da verdade absoluta, uma das opiniões falaciosas ou da absoluta falsidade, e uma opinião plausível.

A via da absoluta verdade

O grande princípio parmediano, que é o próprio princípio da verdade, é este: o ser é e não pode não ser; o não ser não é e não pode ser de modo algum. O ser, portanto, é e deve ser afirmado, o não-ser é e deve ser negado, e esta é a verdade; negar o ser ou afirma o não-ser é, ao invés, a absoluta falsidade. O ser puro positivo e i não-ser o puro negativo, o ser é a única coisa pensável e exprimível; qualquer pensar, para ser tal, é pensar o ser, a ponto de podermos dizer que pensar e ser coincidem, ao contrário, o não-ser é de todo impensável, inexprimível, indizível e, portanto, impossível.

Neste princípio parmenidiano, os intérpretes há muito indicaram a primeira grandiosa formulação do principio de não-contradição. É este o grande princípio que receberá de Aristóteles a sua mais célebre formulação de defesa, e que constituirá não o fundamento de toda a lógica antiga, mas de toda a lógica do Ocidente. O ser é ingênito e incorruptível. De fato, é impossível que tenha sido gerado, enquanto, se assim fosse, deveria derivar ou do não-ser ou do ser: E por estas mesmas razões é impossível que se compra.

O ser não tem, pois, um passado e nem mesmo um futuro mas é presente eterno sem início nem fim. O ser é, ademais, imutável e absolutamente imóvel, é encerrado, nas cadeias do limite, da necessidade inflexível: ele é perfeito e acabado e, como tal, não carece e não tem necessidade de nada e, por isso, permanece em si mesmo idêntico no idêntico.

O ser também é indivisível em partes diferentes e, portanto, é um contínuo todo igual, já que qualquer diferença implica o não-ser. E a igualdade e a finitude juntas sugerem evidentemente a representação esferiforme, que o Eleata explicitamente atribui ao seu ser:

É evidente que tal concepção do ser postulava também o atributo da unidade. Única verdade é, pois, o ser ingênito, incorruptível, imutável, imóvel, igual, esferiforme e uno: o resto é apenas nome vão: é claro que o ser parmenidiano é o ser do cosmo, imobilizado e em grande parte purificado, mas ainda claramente reconhecível: é, por paradoxal que isso possa soar, o ser do cosmo sem o cosmo.

 A via do erro

A raiz do erro da “opinião dos mortais”, portanto, está na admissão do não-ser ao lado do ser e na admissão da possibilidade da passagem de um ao outro e vice-versa.

A terceira via: a explicação plausível dos fenômenos e a “doxa” parmenidiana

Parmênidas, além da Verdade e da Opinião falaciosa dos mortais, reconhecia a possibilidade e a legitimidade de certo tipo de discurso que tentasse dar conta dos fenômenos e das aparências sem ir contra o grande princípio, isto é, sem admitir, juntos, o ser e o não-ser, é necessário admitir a existência das aparências quem tudo indaga em todos os sentidos. Os mortais puseram duas formas supremas: “luz” e “noite”, concebendo-as como contrárias e deduzindo todo o resto delas, é claro que Parmênides pretende corrigir o erro dos mortais:

De fato eles [os mortais] estabeleceram dar nome a duas formas cuja unidade é necessária: nisso eles erraram. Os mortais, portanto, erraram porque não compreende que as duas formas estão incluídas numa superior unidade necessária, vale dizer, na unidade do ser.

Aporias estruturais da filosofia parmenidiana

Se o grande princípio de Parmênides, tal como foi por ele formulado, salvava o ser, perdia o fenômenos. Era preciso que a filosofia, depois de Parmênides e dos eleatas, encontrasse novas vias que permitissem salvar, além do ser, também os fenômenos.


Os agrupamentos dialéticos contra o movimento

Os argumentos de Zenão que nos foram transmitidos referem-se ao movimento e ao múltiplo. O primeiro argumento, chamado “da dicotomia”, sustenta que o movimento é absurdo e impossível, porque um corpo, para alcançar um alvo, deveria primeiro alcançar a metade do caminho a percorrer, mas antes de alcançar aquela metade, deveria alcançar a metade da metade, e antes ainda a metade da metade, e assim ao infinito, porque há sempre uma metade da metade.

O segundo argumento, chamado “de Aquiles”, sustenta que o movimento é de tal modo absurdo que, se por hipótese nós o concedêssemos, e puséssemos Aquiles de pésvelozes a perseguir uma tartaruga, ele jamais a alcançaria, porque as mesmas dificuldades vistas no precedente argumento se reapresentariam do outra forma: Aquiles deveria primeiro chegar ao ponto em que a tartaruga se encontrava na partida, depois ao ponto em que ela se encontrasse quando ele alcançasse o seu ponto de partida, e depois ainda ao terceiro ponto no qual ela se encontrasse quando ele tivesse alcançando o segundo, e assim ao infinito.

O terceiro argumento é chamado “da flecha” e demonstra que uma flecha, que se crê em movimento, na realidade está parada. O quarto argumento, chamado “do estádio”, mostra, ao invés, a relatividade da velocidade e, portanto, do próprio movimento do qual a velocidade é propriedade essencial, e, com esta demonstração da realidade, exclui a objetividade e a realidade do movimento.

3. Os argumentos dialéticos contra a multiplicidade

Análogo procedimento Zenão usava para demonstra a impossibi-lidade de que o ser seja múltiplo, isto é, que exista uma multiplicidade de seres.

4. A importância de Zenão

A dialética zenoniana agiu fortemente muito além da escola eleata,

Sobre a sofísica, sobre o próprio método socrático, sobre os megáricos e, em geral, contribuiu de maneira significativa para a formação das várias técnicas de argumentação e para o nascimento da lógica. A demonstração que será chamada por absurdo é, substancialmente, uma descoberta de Zenão.


IV. MELISSO DE SAMOS

A sistematização do eleatismo

Melisso pode ser definido como o “sistematizador” do pensamento eleata.

2. Os atributos do ser e a sua dedução

Melisso entendeu o ser tal como Parmênides o entendeu e, como ele, demonstrou o seu caráter ingênuo e a sua incorruptibilidade. Todavia, em lugar de conceber a eternidade desse ser toda recolhida no instante atemporal sem passado e sem futuro, preferiu dilatá-la ao infinito e concebê-lo como um “sempre será”. Mas a novidade maior de Melisso é, sem dúvida, a afirmação de que o ser é infinito. Parmênides afirmara o ser finito, respeitado o pressuposto de que o infinito é imperfeito e só o finito é perfeito, enquanto é tudo, o ser é eterno e infinito.

Melisso indicou que, se fosse limitado, o ser deveria confirmar com o ser deveria confirmar com o vazio, isto é, com o não-ser, o que é impossível.

Ademais de eterno e infinito, o ser é uno. E o ser é uno porque infinito, fragmento 6. Se é infinito, deve ser uno. De fato, se fosse dois, não poderiam ser infinitos, mas um teria limite no outro. O ser, ainda mais, como queria Parmênides, é igual, é inalterável, seja qualitativo, seja quantitativamente, e é imóvel. Enfim, Melisso disse que o ser é incorpóreo: o ser não tem corpo, não porque seja espiritual, mas porque e uno-infinito e, como tal, não é determinado nem por limites internos nem por limites externos, nem pelos limites da “esfera bem redonda” parmenidiana: não ter corpo coincide, pois, com não ter limite, com o ter grandeza infinita.

3. Eliminação da esfera da experiência e da “doxa”

Uma última novidade de Melisso e a sistemática eliminação do mundo dos sentidos e da doxa. Assim o eleatismo termina afirmando um ser eterno, infinito, uno, igual, imutável,imóvel, incorpóreo, que exclui qualquer possibilidade de um múltiplo, porque corta pela raiz qualquer pretensão de reconhecimento dos fenômenos.

É claro que o Ser, como o descreveram os eleatas, só pode ser o ser Deus, isto é, um ser privilegiado e não todo o ser, mas os eleatas não puderam distinguir ser de Deus e ser do mundo e, portanto, Deus e mundo, porque “ser”, para eles, não podia ter senão um único sentido, o sentido integral. Eles só teriam podido sair da aporia distinguindo ser e ser, isto é, distinguido diferentes significados do ser.


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