domingo, 28 de julho de 2024

KERYGMA E DOGMA: CONTINUIDADE OU DESCONTINUIDADE?

 



 

Raniero Cantalamessa, Do Kerigma ao Dogma. Estudos sobre a Cristologia dos Padres. Milão: Vita e Pensiero, 2006.

Resumo: Paolo Cugini

 

O querigma cristológico e o dogma cristológico são realidades em movimento, processos vitais que estão diretamente enxertados na vida e no movimento da Igreja que constituem o suporte vital comum a ambos. O que é preciso comparar é o dinamismo interno, a direção de desenvolvimento que caracteriza os dois processos. Perguntamo-nos se a dupla tendência que vimos caracterizando a cristologia patrística é a mesma que caracteriza o querigma bíblico sobre Cristo, ou se houve uma reviravolta entre uma e outra. A resposta nos chega da teologia bíblica dentro do querigma bíblico notamos uma tendência que leva a preferir títulos com conteúdo ontológico mais explícito, tendência da qual os títulos de logos, Deus é filho de Deus, emergem em uma posição cada vez mais privilegiada. Acima de tudo, esta tendência manifesta-se dentro do mesmo título, no diferente significado com que é utilizado nas diferentes fases de desenvolvimento do querigma. Filho de Deus, por exemplo uma vírgula que no início indica o estado do messias celeste inaugurado pela ressurreição, aos poucos desenvolve o seu conteúdo até caracterizar Jesus como revelador de Deus e como mediador entre Deus e os homens, não apenas com base em suas ações, mas também em seu ser.

Poderíamos dizer o mesmo sobre a tendência de retroceder cada vez mais na história e no ser de Cristo, retrocedendo o ato constitutivo. Ei, a presença dessa tendência no novo testamento pode ser visualizada por uma sucessão. A comunidade primitiva situa o momento decisivo, a data de nascimento da cristologia, no momento da ressurreição. Mas vamos olhar para a progressão dos Evangelhos. O primeiro sinóptico, Marcos, inicia sua história de Jesus no momento de seu batismo, os dois seguintes, Mateus e Lucas, iniciam-na no momento do nascimento de Maria. João o faz partir do início com um salto, ou seja, da pré-existência. O aparecimento do título logos nesta fase indica o novo interesse pela pré-história da salvação.

Estas observações permitem-nos concluir que as tendências fundamentais da cristologia patrística apenas continuam na mesma direção, amplificando-as pela maior duração que abrange, processos em pleno andamento na cristologia do Novo Testamento.

Não podemos, portanto, falar de descontinuidade entre querigma e dogma, exceto na medida em que tomamos as duas realidades num processo acabado e as comparamos ponto por ponto e é claro que neste último caso a cristologia bíblica nos aparece como mais funcional, mais histórica salvífica. , e a patrística como mais ontológica. A diferença, deste ponto de vista, é grande e não deve de forma alguma ser minimizada. Mas esta é uma diferença de grau e não de qualidade. E mesmo neste caso a censura não pode ser colocada entre o querigma e o dogma, entre o último escrito do Novo Testamento e o primeiro escrito patrístico, senão com base em razões teológicas e dogmáticas, a distinção entre escritos canônicos e não canônicos. Em si, o ponto de passagem poderia ser estabelecido em outro lugar, por exemplo em Irineu ou em outros autores, e ser plenamente justificado de um ponto de vista puramente histórico. Sendo um processo constante e retilíneo, este divisor de águas distinguiria sempre uma fase anterior menos ontologizada de uma fase posterior mais ontologizada, precisamente a cristologia da Calcedônia, como vimos pelos respectivos símbolos da vírgula e mais ontologizada e menos histórica que a de Nicéia, assim como a de Nicéia e Atanásio em particular, é semelhante à de Irineu. A ontologização, portanto, não marca uma descontinuidade entre o querigma e o dogma cristológico.

Pode o problema da continuidade ser colocado num nível mais radical que pode ser formulado desta forma, a censura que não existe entre o Cristo do dogma e o Cristo do querigma, ou da fé, existe por acaso entre o Cristo da fé e Jesus? de história? Até que ponto a reflexão da comunidade sobre o ser de Cristo encontra o seu fundamento na história, isto é, naquilo que Jesus fez ou pensou e disse sobre si mesmo? O título filho de Deus, por exemplo, que desempenhou um papel tão importante nesta reflexão, surge também pela primeira vez em termos de conteúdo da fé pós-pascal dos discípulos ou é ainda de alguma forma na consciência de que Jesus tinha de si mesmo e que podemos conhecer historicamente, por exemplo, do uso de abbà?

O patrologista só pode tentar conectar o Cristo do dogma ao Cristo do querigma.

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