Raniero Cantalamessa, Do Kerigma ao Dogma. Estudos
sobre a Cristologia dos Padres. Milão: Vita e Pensiero, 2006.
Resumo: Paolo Cugini
O querigma cristológico e o
dogma cristológico são realidades em movimento, processos vitais que estão
diretamente enxertados na vida e no movimento da Igreja que constituem o
suporte vital comum a ambos. O que é preciso comparar é o dinamismo interno, a
direção de desenvolvimento que caracteriza os dois processos. Perguntamo-nos se
a dupla tendência que vimos caracterizando a cristologia patrística é a mesma
que caracteriza o querigma bíblico sobre Cristo, ou se houve uma reviravolta
entre uma e outra. A resposta nos chega da teologia bíblica dentro do querigma
bíblico notamos uma tendência que leva a preferir títulos com conteúdo
ontológico mais explícito, tendência da qual os títulos de logos, Deus é filho
de Deus, emergem em uma posição cada vez mais privilegiada. Acima de tudo, esta
tendência manifesta-se dentro do mesmo título, no diferente significado com que
é utilizado nas diferentes fases de desenvolvimento do querigma. Filho de Deus,
por exemplo uma vírgula que no início indica o estado do messias celeste
inaugurado pela ressurreição, aos poucos desenvolve o seu conteúdo até
caracterizar Jesus como revelador de Deus e como mediador entre Deus e os
homens, não apenas com base em suas ações, mas também em seu ser.
Poderíamos dizer o mesmo sobre
a tendência de retroceder cada vez mais na história e no ser de Cristo,
retrocedendo o ato constitutivo. Ei, a presença dessa tendência no novo
testamento pode ser visualizada por uma sucessão. A comunidade primitiva situa o
momento decisivo, a data de nascimento da cristologia, no momento da
ressurreição. Mas vamos olhar para a progressão dos Evangelhos. O primeiro
sinóptico, Marcos, inicia sua história de Jesus no momento de seu batismo, os
dois seguintes, Mateus e Lucas, iniciam-na no momento do nascimento de Maria.
João o faz partir do início com um salto, ou seja, da pré-existência. O
aparecimento do título logos nesta fase indica o novo interesse pela
pré-história da salvação.
Estas observações permitem-nos
concluir que as tendências fundamentais da cristologia patrística apenas
continuam na mesma direção, amplificando-as pela maior duração que abrange,
processos em pleno andamento na cristologia do Novo Testamento.
Não podemos, portanto, falar
de descontinuidade entre querigma e dogma, exceto na medida em que tomamos as
duas realidades num processo acabado e as comparamos ponto por ponto e é claro
que neste último caso a cristologia bíblica nos aparece como mais funcional,
mais histórica salvífica. , e a patrística como mais ontológica. A diferença,
deste ponto de vista, é grande e não deve de forma alguma ser minimizada. Mas
esta é uma diferença de grau e não de qualidade. E mesmo neste caso a censura
não pode ser colocada entre o querigma e o dogma, entre o último escrito do
Novo Testamento e o primeiro escrito patrístico, senão com base em razões
teológicas e dogmáticas, a distinção entre escritos canônicos e não canônicos.
Em si, o ponto de passagem poderia ser estabelecido em outro lugar, por exemplo
em Irineu ou em outros autores, e ser plenamente justificado de um ponto de
vista puramente histórico. Sendo um processo constante e retilíneo, este
divisor de águas distinguiria sempre uma fase anterior menos ontologizada de
uma fase posterior mais ontologizada, precisamente a cristologia da Calcedônia,
como vimos pelos respectivos símbolos da vírgula e mais ontologizada e menos
histórica que a de Nicéia, assim como a de Nicéia e Atanásio em particular, é
semelhante à de Irineu. A ontologização, portanto, não marca uma
descontinuidade entre o querigma e o dogma cristológico.
Pode o problema da
continuidade ser colocado num nível mais radical que pode ser formulado desta
forma, a censura que não existe entre o Cristo do dogma e o Cristo do querigma,
ou da fé, existe por acaso entre o Cristo da fé e Jesus? de história? Até que
ponto a reflexão da comunidade sobre o ser de Cristo encontra o seu fundamento
na história, isto é, naquilo que Jesus fez ou pensou e disse sobre si mesmo? O
título filho de Deus, por exemplo, que desempenhou um papel tão importante
nesta reflexão, surge também pela primeira vez em termos de conteúdo da fé
pós-pascal dos discípulos ou é ainda de alguma forma na consciência de que
Jesus tinha de si mesmo e que podemos conhecer historicamente, por exemplo, do
uso de abbà?
O patrologista só pode tentar
conectar o Cristo do dogma ao Cristo do querigma.
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