[Material organizado por Paolo Cugini]
Os amigos serão tanto mais caros quanto maior for, em
cada um, o amor pela amada comum.
Por algumas belas páginas sobre a felicidade que se
identifica com a contemplação da verdade, que é Deus, verdade subsistente e
sumo bem (refere-se à obra: O Livre Arbítrio).
"Voltados para o Senhor... a Ele... rendamos
amplíssimas graças. Oremos com toda a alma à sua incomparável
misericórdia" (Confissões).
Possídio: "Mandou que lhe escrevessem os salmos
davídicos que tratam da penitência, e, durante a doença, do leito em que jazia,
olhava para aquelas folhas colocadas na parede em frente, lia e chorava
continuamente lágrimas abundantes." Era sua convicção, de fato, explica o
biógrafo, e expressava-a nas conversas familiares, que ninguém, seja simples
cristão ou bispo, por mais exemplar que seja, deve sair deste corpo sem uma
penitência digna e adequada.
E quanto à oração em geral, o mesmo biógrafo nos dá
este pormenor significativo. Escreve: "Para não ser perturbado por ninguém
no seu recolhimento (no seu recolhimento que era ao mesmo tempo atitude de
penitente e de contemplativo), cerca de dez dias antes de deixar o corpo
pediu-nos, que estávamos presentes, para não deixar entrar ninguém no seu
quarto fora das horas em que os médicos o visitavam ou quando lhe levavam as
refeições. O seu desejo foi cumprido exatamente: e durante todo esse tempo ele
se dedicava à oração."
2. Deus, criador do mundo, concede-me antes de mais
nada que eu te reze bem, depois que me tornes digno de que me libertes, enfim
que me libertes. Deus, por meio do qual todas as coisas que por si mesmas não
existiriam, movem-se para o ser. Deus, que nem mesmo aquelas coisas que se
perdem mutuamente, permites que pereçam. Deus, que do nada criaste este mundo,
este mundo que os olhos de todos percebem como belíssimo. Deus, que não fazes o
mal e o permites apenas para que não aconteça um mal maior. Deus, que manifestas
a poucos, àqueles que se voltam para o que realmente é, que o mal não é uma
realidade. Deus, pela cuja potência o mundo inteiro, mesmo com a parte menos
adequada, alcança a perfeição. Deus, cuja dissonância não produz a dissolução
extrema, pois as coisas piores se harmonizam com as melhores. Deus, que és
amado por todo ser que pode amar, saiba-o ou não. Deus, em quem estão todas as
coisas, mas cuja deformidade existente no mundo não te torna deforme, nem o mal
menos perfeito, nem o erro menos verdadeiro. Deus, que quiseste que apenas os
espíritos puros conhecessem a verdade. Deus, pai da verdade, pai da sabedoria,
pai da vida verdadeira e suprema, pai da bem-aventurança, pai do bem e do belo,
pai da luz inteligível, pai do nosso despertar e da nossa iluminação, pai da
garantia, mediante a qual somos advertidos a retornar a ti.
3. Invoco-te, ó Deus verdade, em quem, de quem e por
meio de quem são verdadeiras todas as realidades que são verdadeiras. Deus
sabedoria, em quem, de quem e por meio de quem são sábios todos os que têm
sabedoria. Deus vida verdadeira e suprema, em quem, de quem e por meio de quem
vivem todas as realidades que têm vida verdadeira e suprema. Deus
bem-aventurança, em quem, de quem e por meio de quem são felizes todos os seres
que são felizes. Deus bem e beleza, em quem, de quem e por meio de quem são
boas e belas todas as realidades que têm bondade e beleza. Deus luz
inteligível, em quem, de quem e por meio de quem brilham de luz inteligível
todos os seres que brilham de luz inteligível. Deus, cujo reino é todo esse
mundo que está oculto ao sentido. Deus, de cujo reino deriva a lei para os
nossos reinos naturais. Deus, de quem afastar-se é cair, voltar-se para quem é
ressurgir, permanecer em quem é ter consistência. Deus, de quem sair é morrer,
caminhar para quem é voltar a viver, habitar em quem é viver. Deus, a quem
ninguém abandona se não for enganado, a quem ninguém procura se não for
chamado, a quem ninguém encontra se não for purificado. Deus, abandonar o qual
significa perecer, tender para quem significa amar, ver quem significa possuir.
Deus, para quem nos estimula a fé, nos eleva a esperança, nos une a caridade.
Deus, com cujo poder vencemos o adversário. Suplico-te. Deus, por meio do qual
recebemos, para não sucumbirmos à morte total. Deus, por quem somos advertidos
para vigiar. Deus, por cuja força separamos as coisas boas das más. Deus, por
quem fugimos do mal e fazemos o bem. Deus, por quem não cedemos às
adversidades. Deus, com cuja ajuda nos sujeitamos corretamente ao poder e com
retidão o exercemos. Deus, por cuja força aprendemos que também são dos outros
as coisas que uma vez julgávamos nossas e também são nossas as coisas que antes
julgávamos de outros. Deus, com cuja ajuda não nos apegamos aos enganos e
armadilhas das paixões. Deus, com cujo apoio as coisas pequenas não nos
diminuem. Deus, por cujo meio o nosso ser melhor não está sujeito ao pior.
Deus, com cuja ajuda a morte é anulada na vitória. Deus, que nos voltas para
ti. Deus, que nos despojas do que não é e nos revestes do que é. Deus, que nos
tornas audíveis. Deus, que nos unes a ti. Deus, que nos introduzes na verdade
inteira. Deus, que nos falas de todos os bens e não nos tornas incapazes de
segui-los, nem permites que isso seja feito por qualquer um. Deus, que nos
chamas de volta ao caminho. Deus, que nos conduzes até à porta. Deus, que
operas, para que a quem bate seja aberta. Deus, que nos dás o pão da vida.
Deus, que nos fazes ter sede daquela bebida, ao sorver a qual não teremos mais
sede. Deus, que acusas o mundo quanto ao pecado, à justiça, ao juízo. Deus, por
cuja força não nos abalam os que não creem. Deus, por quem refutamos o erro dos
que afirmam que as almas não podem merecer junto de ti. Deus, com cuja ajuda
não nos tornamos escravos dos elementos que causam fraqueza e indigência. Deus,
que nos purificas e nos preparas para as recompensas divinas. Vem ao meu
encontro, propício.
5. Agora amo só a ti, sigo só a ti, procuro só a ti e
estou pronto a servir apenas a ti, pois só tu exerces o comando com justiça e
eu desejo ardentemente estar sob o teu poder. Ordena, peço-te, e determina o
que quiseres, mas cura e abre os meus ouvidos para que eu possa ouvir a tua
voz. Cura e abre os meus olhos, com os quais eu possa ver os teus sinais.
Afasta de mim os movimentos irracionais, para que eu possa reconhecer-te.
Diz-me para onde devo olhar, para que eu possa ver-te, e espero cumprir tudo o que
ordenares. Recebe, peço-te, o teu servo fugitivo, ó Senhor clemíssimo. Já
deveria ter expiado suficientemente, bastante já deveria ter sido escravo dos
teus inimigos, que tu esmagas sob os teus pés, bastante já deveria ter sido
ludíbrio de coisas enganosas. Recebe-me, teu servo, que foge dessas coisas,
que, enquanto fugia de ti, fui acolhido como não pertencente a elas. Sinto que
devo retornar a ti; a mim que bato, seja aberta a tua porta; ensina-me como
posso alcançar-te. Não tenho nada além da vontade; não sei nada mais, exceto
isto: que as coisas caducas e transitórias devem ser desprezadas, as coisas
imutáveis e eternas procuradas. Faço isto, ó Pai, porque só isto sei; ignoro,
porém, por onde começar para chegar até ti. Sugere-me tu; mostra-me tu o
caminho; fornece-me o que é necessário para a viagem. Se é pela fé que te
reencontram os que voltam a ti, dá-me a fé; se é pela virtude, dá-me a virtude;
se é pelo saber, dá-me o saber. Aumenta em mim a fé, aumenta em mim a
esperança, aumenta em mim a caridade. Ó tua bondade, singular e admirável!
6. Para ti quero ir e com que meios se chega até ti,
torno a perguntar-te. Se, de fato, nos abandonares, perecemos. Mas tu não
abandonas, porque és o sumo bem, que ninguém nunca procurou retamente sem
encontrar. E procurou retamente todo aquele que fizeste capaz de procurar
retamente. Faze, ó Pai, que também eu te procure, arranca-me do erro; que,
enquanto te procuro, não encontre outra coisa senão a ti. Se não desejo nada
além de ti, possa eu enfim encontrar-te, ó Pai, eu te peço. Se em mim ainda
sobrevive o desejo de algo supérfluo, purifica-me tu mesmo e torna-me capaz de
ver-te. Quanto ao mais, relativamente à saúde deste meu corpo mortal, pois não
sei que utilidade possa tirar disso para mim ou para os meus, a ti o confio,
Pai sapientíssimo e ótimo, e por ele te pedirei o que me sugerires no momento
oportuno. Agora peço à tua suprema clemência apenas que me convertas totalmente
a ti e que não permitas que nada me impeça de ir ao teu encontro; que me
permitas, mesmo governando e conduzindo este corpo, ser puro, forte, justo,
prudente, amante perfeito e participante da tua sabedoria, digno da cidadania e
cidadão do teu reino de toda felicidade. Amém, amém (Solilóquios).

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