quarta-feira, 15 de outubro de 2025

FILOSOFIA DA RELIGIÃO (aulas 2007- esboço da primeira parte do projeto)

 




 

 Paolo Cugini

 

 

1. O problema que tentaremos enfrentar ao longo do curso é a busca da essência da religião. Precisamos saber, para isso, se o homem é equipado para viver uma experiência religiosa. Antes de proceder por este caminho será necessário delimitar o campo da nossa pesquisa –momento epistemológico- e pesquisar de que forma a religião é interpretada –momento hermenêutica-. É a partir destas duas delimitações da pesquisa, que poderemos iniciar a nossa analise da religião do ponto de vista filosófico. Só que também a este nível, será necessário realizar uma escolha metodológica. Vários, de fasto, são os caminhos filosóficos que tentaram desvendar a religião. Aquilo que, a nosso aviso, oferece os instrumentos mais respeitos do nosso objeto de pesquisa é a fenomenologia.

 

2. A nossa abordagem filosófica á religião é fenomenológico.  Segundo a fenomenologia o fenômeno é simplesmente aquilo que se dá á consciência. È a consciência o primeiro testemunho de um fenômeno de qualquer tipo ele seja. Segundo J.L Marion nessa altura, podemos encaixar do ponto de vista filosófico também os fenômenos assim chamados religiosos, antes excluídos do debate filosófico em quanto considerados sem alguma objetividade especifica. Do ponto do vista fenomenológico, a verdade de um fenômeno não depende da sua possibilidade de ser captada pelos sentidos, mas sim pela consciência. Aquilo que aparece é em quanto se doa, se oferece. “Tanta aparência, tanto ser”[1].

Heidegger afirmava que o fenômeno é aquilo que “se mostra de si mesmo”, também somente por indícios. Esse é o ser que pode se manifestar somente através de indícios que o manifestam, o anunciam (cf a fenomenologia do inaparente de Heidegger). Por isso também o invisível pode ser considerado um fenômeno autêntico. É por essa razão que, segundo Marion, a revelação divina, pode entrar no âmbito dos fenômenos e a fenomenologia parece oferecer os instrumentos capazes de elaborar o seu conhecimento.  O dar-se de um fenômeno pressupõe sempre um eu que receba, apesar de que não se reduz a ele. De uma certa forma, a dinâmica fenomenológica parece limitar a liberdade da manifestação do fenômeno religioso, da revelação divina. Deveria existir um fenômeno que oferece infinitamente mais da intenção, ou seja, dos dados elaborados pelo eu.

 

3. Van der Loow nas suas pesquisas de fenomenologia da religião, afirma que qualquer homem busca algo que possa estendera sua vida, ou seja, uma potência. Por isso o homem vive angustiado até que não encontre esta potência, que, no plano horizontal pode ser identificado com a arte, a política, etc. Do ponto de vista fenomenológico podemos afirmar que, quando o homem é em busca de uma potência de vida, experimenta algo que vem ao seu encontro manifestando-se como uma potência suprema: é o fenômeno religioso. Somente o homem aberto ao transcendente acolhe este tipo de fenômeno, porque o reconhece como tal.

 

4. Como acontece o encontro do fenômeno com o sujeito? Sem duvida não de forma imediata, mas sim, mediata. Esta mediação é o símbolo. A possibilidade de uma fenomenologia do invisível tramite indícios e o aprofundamento filosófico da realidade fenomênica com doação, leva a refletir sobre o horizonte simbólico que é o dato mais típico da experiência religiosa. Segundo a fenomenologia da religião, os indícios do invisível não são outra coisa que os símbolos. Do ponto de vista epistemológico os símbolos devem ser considerados autenticas manifestações ierofanicas, com uma peculiar valência revelativa. Nessa altura, podemos afirmar que a condição da possibilidade do homem de conhecer o transcendente é dato e mediato da dimensão simbólica. Os símbolos religiosos revelam e, ao mesmo tempo, escondem o Sagrado.

Segundo Luis Pareyson[2] o dato físico e o dato transcendente que se encontram no símbolo são inseparáveis.

Cada símbolo religioso é abitado por uma valência positiva de revelação. A operação simbólica entra para suprir a deficiência de conhecimento imediato da realidade divina.

 

5. O tipo de conhecimento que nos conseguimos na experiência religiosa é evidente? O conhecimento simbólico, apesar de ter a sua origem absoluta na livre vontade revelativa do divino, se realiza através de um circulo que vá do símbolo á realidade simbolizada para voltar ao símbolo. Só através dos símbolos se abre a realidade simbolizada. Só á luz da transcendência os símbolos são percebidos como tais e se tornam revelativos.

Por isso, podemos afirmar que o tipo de conhecimento do divino que obtemos no conhecimento simbólico é sim evidente, mas de uma evidencia de tipo intuitivo, ou seja, não de tipo dedutivo nem de tipo indutivo. Aquilo que na experiência religiosa é captado imediatamente não é o ser de Deus, mas o indicio dEle. O símbolo manifesta algo de totalmente alheio: isso torna-se evidente no conhecimento simbólico. Para isso torna-se necessário um relacionamento que envolva totalmente a pessoa.

 

6. Segundo Max Scheler[3] a relação simbólica tem uma característica especial: é o objeto simbólico mesmo que anuncia e torna presente o divino transcendente. O exemplo disso encontramos no conhecimento do outro. De fato, as expressões do rosto são revelativas dos sentimentos da pessoa encontrada (cf. Levinas). Assim a revelação do transcendente é a expressão de uma liberdade soberana que não pode ser demonstrada, mas si  reconhecida intuitivamente nas suas expressões. Na medida em que o homem se deixa guiar do movimento intencional das mediações simbólicas dos eventos revelativos, é capaz de captar a realidade do divino e a sua comunicação.

O objeto dos atos religiosos é ao mesmo tempo a origem da existência deles. Tudo aquilo que sabemos de Deus o sabemos por meio dEle.

 



[1] J.L. Marion, Filosofia e rivelazione, in Studia Patavina 36 (1989) 3, 1-19.

[2] L. Pareyson, filosofia edd esperienza religiosa, in Annuario filosófico I, 1985, 25.

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